É preciso ter dinheiro para ser “nerd” no Brasil?

De uns tempos pra cá me dei conta de que não tenho aumentado meu acervo de livros, quadrinhos, filmes, séries, DVDs, animes, mangás, posters, figuras de ação, camisetas e demais acessórios que praticamente definem minha identidade no meio com o qual convivo. Apesar de já ter caído a ficha de que estou vivendo uma vida mais adulta, isto não significa que deixei de gostar das coisas que sempre despertaram o meu crescente interesse desde a mais tenra infância.

O que acontece é que o escasso material de qualidade voltado para a cultura nerd comercializado aqui no Brasil encontra-se com os preços nas alturas, inviabilizando o surgimento de novos fãs, leitores, colecionadores, jogadores e Mestres de RPG; além de afastar os veteranos que cresceram, constituíram famílias e têm outras prioridades para os seus salários que vêm antes de seus hobbies.

Sempre li quadrinhos usados comprados na feira ou então emprestados por amigos que compartilhavam do mesmo tipo de lazer. Ao começar a trabalhar tive a sorte de pegar o boom dos anos 90 onde havia uma gama de lançamentos mensais acompanhados por preços bem mais acessíveis que os atuais. Era possível acompanhar sagas inteiras numa época que a internet ainda não estava ao alcance de todos.

Os preços de capa chegavam a valer centavos proporcionando a aquisição de todos os títulos em banca. Livros de RPG e romances eram encontrados com facilidade em livrarias que não precisavam ser especializadas nos assunto e as editoras utilizavam capa mole e impressão interna em preto e branco para baratear ainda mais os custos permitindo que eu tivesse em minha coleção títulos de GURPS, Daemon, Aventuras Fantásticas, Storyteller e me sobravam uns trocados para cards e camisetas com estampas de super-heróis e outros ícones pop da cultura nerd como Arquivo X e Star Trek.

Hoje muitos dos pontos onde eu conseguia isso tudo fecharam suas portas devido a uma queda no movimento causado não só pela crise econômica que sempre assombrou nosso país, mas também graças aos valores elevados de sagas encadernadas de quadrinhos como Batman – Silêncio e livros de RPG com capa dura, papel especial e arte interna colorida só pra ficar bonitinho na estante.

Os dados são caros para que grupos iniciantes possam criar raízes. Não digo que apenas uma pequena elite freqüente encontros e eventos munidos das últimas novidades, porém fica claro que só quem for pertencente à classe média terá recursos para ir ao cinema várias vezes por mês, comprar os boxes em DVD das temporadas de suas séries e animes favoritos, manter seus decks e boosters atualizados para qualquer torneio com as mais recentes edições, e decorar seus lares com estatuetas de resina e miniaturas que representam o mundo do entretenimento.

Isso sem falar naqueles que recorrem aos downloads, scans e outros meios para não ficar totalmente por fora do que acontece no nicho nerd. É triste, viu? Qual seria a sugestão que viabilizasse a reversão deste quadro? Baixar os preços? Diminuir a qualidade para reduzir custos? Produzir material em duas versões, sendo uma de luxo de menor tiragem para livrarias especializadas e outra mais em conta para distribuição em banca? Investir nas novas editoras e nos novos autores?

Não sabemos qual das alternativas acima daria certo, contudo acredito que a resposta está na possibilidade daqueles que publicam, importam, traduzem, editam, comercializam e mantêm o mercado nerd aquecido não se esqueçam de ouvir sempre o que nós como consumidores temos a dizer sobre um produto, um lançamento, nossas preferências e, principalmente, capacidade e tempo para absorver o que chega às prateleiras. Quem foi que disse que é fácil ser fã de algo cult numa sociedade de consumo onde o lucro de alguns está acima da paixão dos demais? Pensem, reflitam e se manifestem e talvez assim as coisas melhorem um pouco.

Por William Robsons

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11 Comments
  1. Brasil

    Saúde não funciona, via usar o SUS pra ver

    Previdência sucateada, contribui uma vida inteira para no final receber uma miséria

    Educaçao é boa? …

    Trânsito tá bom? Aeroportos?

    Segurança tá boa?…

    O que funciona no BRASIL????

    Se isso é o básico pra viver e nada funciona com preço justo, imagina com a Diversão Nerd….

  2. Caro Hanuts, seu nick deveria ser Tyrion Lannister dada sua sincera, verdadeira e dura opinião.

    Infelizmente, ainda, vivemos em um país onde a tríade de serviços básicos (educação, saúde e segurança) ainda não são oferecidas de forma igualitária pelo poder público. Dado que não temos nem o básico, serviços “dispensáveis”, mas necessários, como diversão, mais particularmente “diversão nerd”, tornam-se ainda mais caras.

    Triste realidade…

  3. Eu vou insistir no fato de que se houver um aumento no número de interessados no hobbie, tudo se melhora. A demanda deve reduzir os preços, aumentar as vendas, enriquecer as editoras, gerar eventos, e por ai vai. Se adaptar a um mercado cada vez menor é enforcar a própria corda de pouco em pouco, isso do ponto de vista econômico é a derrota completa.

    Os preços dos livros estão num patamar elevado por conta do número baixo de tiragens. Não creio que reduzir a qualidade desses produtos só para tornar acessíveis seja um bom negócio: antes de comprar um livro de RPG, por mais acessível que seja, primeiro o grupo de novatos precisa aprender a jogar RPG.

    De fato o hobbie é característico da classe média, mas, temos uma ascensão de classes por aqui, logo, o problema deixa de ser o poder de consumo para a falta de novos jogadores. Não serão livros escondidos nas prateleiras escuras de livrarias perdidas no limbo que convidarão novos jogadores para conhecer o hobbie.

  4. Isso é complicado mesmo . Certa vez tinha pego uma revista antiga de video game e tava foleando ela e tava lá uma matéria sobre os card games Magic the Gathering , e vi nesta matéria o preço dos cards cada pacote e era R$0,99 , hoje em dia nem sei mais qual é o preço direito.

    Quanto aos livros de rpg , acredito que o pdf seja a solução mais viável atualmente, porem sabemos que a pirataria rola a solto por ai.

  5. Há um tempo atrás discuti esse mesmo assunto em uma roda de amigos e cheguei a algumas conclusões. Primeiro de tudo digo que concordo plenamente com o artigo, exceto pela sua conclusão.

    Sim, ultimamente é tudo meio caro, então acredito que a palavra chave aqui é a ESCOLHA.

    Livros, quadrinhos, games, RPG. Convenhamos, quem trabalha não tem tanto tempo assim para abraçar tudo o que vê por aí e se regozijar toda a vez que entra em uma comic store. É necessário um filtro! Eu particularmente deixei de acompanhar lançamentos periódicos, mas compro alguns especiais.

    Eu não invisto um centavo sequer em miniaturas. Acho uma perda de tempo e dinheiro (opinião pessoal), acho legal, mas se for parar e pensar, o preço das miniaturas está tão salgado que deixar de comprá-las me possibilita realizar outras compras, como um móvel melhor, um item de decoração ou um equipamento eletrônico para minha residência. Se a questão é “decorar”, acredito que exista opções melhores do que miniaturas de resina.

    Convenções, eu evito ir. Sério! As vezes é muito investimento para pouco aproveitamento. Tem suas consequências, claro, mas é uma decisão minha. Não que eu nunca vá, mas eu vou em algumas principais.

    Ou seja, não deixei de consumir, apenas mudei minhas preferências de consumidor. Sei que nem todos concordam com isso (porém, como digo, minha opinião é pessoal e intransferível), mas se o problema é a falta de dinheiro para entretenimento, então é necessário fazer um filtro e dedicir o que é mais importante.

    Questão de administrar o dinheiro!

    • Perdoem-me pelo “double”, mas eu simplemente me esqueci de falar sobre card-games! Eu simplesmente parei de jogá-los por diversos motivos, mas o principal é que se viraram quase um investimento financeiro do que um entretenimento.

      Mas eu ainda jogo Munchkin! =)

  6. Acho que a maioria de voces estao mal informado….
    Viver no Brasil é caro, mas nao tem nada haver com saude educaçao e previdência…….e ter hábitos “nerd” nunca foi tao barato….o dolar esta baixo a muito tempo e hoje a grande maioria de nos trabalha e nao depende do papai para comprar seus livros e jogos….

    quando era adolescente dependia do meu pai para sustentar meus habitos nerd, mas hoje eu compro os livros que quero…creio que seja assim para a grande maioria…..

    ser nerd hoje para mim é muito mais facil……

    liros importados nao tem imposto entao com internet é facil encomendar e nada caro……

    Caro é ser playboy parceiro…….

    • Concordo, mas o problema é exatamente esse. Para nós com mais de 10 anos de RPG e que trabalhamos é uma coisa, mas eu não vejo mais garotos de 11 anos juntando mesadas e comprando livros de RPG como eu fazia com o meu grupo de jogo.
      Creio que o problema seja marketing. Alguma coisa (tipo o RPG ser bem visto numa novela das oito da globo de modo razoavelmente frequente, uma novela é o bastante), seja lá o que for, que consiga atrair um novo público.

    • Bom seria se diversão nerd fosse somente os livros, e não envolvesse um mundo de coisas como brinquedos, jogos tabuleiro eletrônicos, video games, etc…

      Pagar 80% de tributos quando entra no brasil é algo que funciona?

      Desculpe, mas eu acho um absurdo

      Pagar 400 reais pela importação de conquest of nerath, ao passo que custa 60 dólares nos EUA, não é uma coisa que faz eu pensar que a minha vida de nerd é fácil…

      muito pelo contrário

  7. Nerd se resume apenas no que eu compro?

  8. um empreendimento de importação e massa desse material, não conseguiria melhores preços pra distribuição?

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