OPERA Conspiração do Amanhecer

Conspiração do Amanhecer, de Marcelo Telles, foi o primeiro cenário lançado para o sistema OPERA pela editora Comic Store, o primeiro cenário brasileiro de RPG divulgado na internet e o primeiro a virar livro. A resenha a seguir (2.836 leituras) foi escrita pelo Newton “Tio Nitro” e publicada no antigo portal em 18 de julho de 2004.

“Conspiração do Amanhecer” é o primeiro cenário para o Sistema Ópera de Leonardo Andrade e Rogério Godoy publicado pela Editora Comic Store. Escrito por Marcelo Telles, “Conspiração do Amanhecer” coloca os jogadores em meio a uma guerra de homens e mulheres com poderes paranormais que lutam para controlar o mundo desde os tempos antigos. Saiba mais sobre esse conflito paranormal nessa resenha feita por Newton “Nitro”! E no final temos dois brindes: um novo e poderoso poder psíquico para os Homens do Amanhecer (Sistema Ópera) e um Wallpaper Exlusivo (by Nitro).

Um dos meus filmes favoritos é “Scanners” dirigido pelo grande David Cronemberg. Para os nerds dinossauros que como eu cresceram durante a década de 80 e viveram totalmente a febre dos filmes “gore” (aqueles filmes sem frescura daquela época, cheio de tripas explodindo, cabeças estourando, etc.), David Cronemberg era como um “deus”. Seus filmes me deixavam sempre “embasbacado” e merecem ser assistidos por quem leva o horror e o fantástico à sério. Filmes como “Videodrome”, “Filhos do Medo”, “Gêmeos, Mórbida Semelhança”, “A Mosca” sempre me deixaram com uma forte impressão que não conseguia tirar fácil da minha cabeça. Mas “Scanners” era o meu favorito. Nesse filme, o “Cronemblearg” (como ele é conhecido dos fâs mais “hardcores”) mostra pessoas que tem poderes psíquicos poderosos, os “Scanners” que entram em combate quando se encontram. O filme era uma espécie de X-Men muito realista (e muito antes da série Ultimate, dos Watchmen e dos Authority da vida!) e tinha cenas fantásticas (como as cabeças explodindo como resultado de um combate entre dos Scanners, entre outras coisas).

Mas porque estou falando desse filme se esta resenha é sobre o “Conspiração do Amanhecer”? Bem, para quem sempre quis um RPG focado em poderes psiônicos, o cenário me fez lembrar do filme “Scanners”, abrindo possibilidades para um complexo e paranóico conflito entre homens e mulheres com poderes paranormais. Agora já podemos fazer os nossos próprios “Scanners” e sair por aí explodindo cabeças!

“Conspiração do Amanhecer” é um RPG que segue a linha do Horror Contemporâneo (que tem suas origens no antológico Call of Cthulhu, se popularizou com o Mundo das Trevas da White Wolf, fez sucesso no Brasil com o cenário Trevas da Daemon, e tem vários representantes interessantes como Kult (Metropolis), Crepúsculo (Conclave), Chill (da Mayfair, um ótimo RPG velhão de horror que pouca gente conhece) entre outros. Porém o CdA (como é mais conhecido o “Conspiração do Amanhecer”) tem um diferencial importante: o foco do jogo está nos poderes psíquicos dos “Homens do Amanhecer”, uma raça de humanos evoluídos, os Homo Omnisapiens, que vêem, desde o início dos tempos, se preparando para o Amanhecer, ou seja, o dia onde eles tomarão o seu lugar como a raça dominante do planeta. Inspirados pela “Visão do Amanhecer”, uma misteriosa profecia que fala do tempo futuro, onde a raça humana irá acabar e a era dos homens do Amanhecer irá iniciar”.

O Livro, Capa e Ilustrações:

O livro segue a excelente qualidade dos produtos da Comic Store (O Anel Elemental, Ópera RPG), com um papel muito “mega”, brilhante e que ressalta as ilustrações. Os ilustradores do livro são Birous, Márcio Fiorito e Neriga, e fizeram um trabalho excelente em passar o clima e os personagens típicos do cenário. A arte está elegante, toda arte-finalizada (o que eu gosto, porque limpa mais os traços e fica ótimo no preto-e-branco). Como eu sempre elejo as artes que mais gostei nas minhas resenhas, vamos lá: gostei muito do monge-kung-fu dos Sidartas (pag.25) feito pelo Fiorito, e a arte (sem créditos, quando é que o pessoal vai colocar as assinaturas em artes de RPG, quase todo livro que eu resenho tem artes sem créditos!) do velho e da jovem dando comida aos pombos no parque (pag. 09). Essa última arte me lembrou muito uma cena do Sandman, onde ele e a morte estão sentados no parque.

Uma das coisa que me chamou atenção na capa foi os símbolos das Fações, que se repetem nas barras laterais do livro. A capa é limpa, com uma ilustração transparente por trás do logo. É uma ilustração de um cérebro no centro de um Sol, o que indica bem o tema do livro.

Introdução e Conto:

O livro começa com uma breve introdução ao CdA (que foi o primeiro netbook brasileiro de RPG, com a sua primeira versão lançada em 1996, é o Telles é dinossauro como eu!). Em seguida temos um conto introdutório ao cenário (seguindo a tradição dos RPGs de Horror Contemporâneo). Gostei muito do conto, que é narrado em cenas curtas do dia-a-dia dos Homens do Amanhecer. O conto de passa no Brasil (eu acho que inicialmente em Brasília, apesar de não apresentar referências) e pode ser usado como o início de uma campanha de CdA.

Como são episódios, em apenas 5 páginas uma quantidade enorme de ação acontece. A primeira coisa que me chamou atenção é a discrição da guerra dos Homens do Amanhecer. Seus poderes psíquicos são praticamente invisíveis aos humanos normais e a guerra entre as Facções (as organizações secretas compostas de Homens do Amanhecer) acontece em completo segredo (diferente do que normalmente acontecia nas minhas campanhas de Vampire, onde fatalmente acontecia uma briga entre Vampiros, Lobisomens, Magos e até Changelins em meio à um shopping lotado, coisa que nenhum paradox, Masquerade, ilusão etc. poderia segurar!). A guerra das Facções do CDA realmente acontece sem que ninguém perceba (os jogadores que fizerem Homens do Amanhecer poderão se comunicar com telepatia) e acho esse um dos pontos fortes do cenário (aumenta a paranóia!).

Origens e História:

Depois da introdução e do conto, temos uma descrição das Origens dos Homens do Amanhecer, com o texto da profecia “A Visão do Amanhecer” e de um panorama na história mundial, alterada e influenciada pelas Facções do CdA. As Facções estão empenhadas em fazer com que o Amanhecer (o fim da raça humana e o início da Era dos Homens do Amanhecer) aconteça. Porém cada uma das Facções tem objetivos bem diferentes em como o Amanhecer irá acontecer.

As 5 Facções principais de CdA se estabeleceram durante a Idade Média, apesar de terem se desenvolvido ao longo da história humana: com os Mercurianos atingindo o auge durante o Império Romano, entre outros eventos. Cada Facção de CdA tem a sua visão do Amanhecer e objetivos específicos para a raça humana. Elas se organizam em células que usam para treinar seus operativos no Poder (os poderes psíquicos dos Homens do Amanhecer). Os personagens que tem o Poder mais ainda não “despertaram” são chamados de Adormecidos. A hierarquia de uma Facção é a seguinte: Iniciado(Primeiro Nível), Irmão (Segundo Nível), Mestre (Terceiro Nível) , Grão Mestre (Quarto Nível) e Iluminado (Quinto Nível).

As Facções tem uma lei maior que chamam de “Lei do Silêncio”, ou seja, não fazer com que os humanos saibam da existência dos Homens do Amanhecer.

As Facções de Conspiração do Amanhecer:

O livro descreve as 5 Fações principais de Homens do Amanhecer, mas deixa uma brecha para os Mestres e Jogadores que queiram criar suas próprias Facções. Seriam as Facções Locais. Além disso, o Jogador que queira criar um Homem do Amanhecer mais independente poderá fazer um Desgarrado. Um Desgarrado não está afiliado à nenhuma das cinco Facções, descritas abaixo.

A primeira das fações descritas são os Amonitas. Eles são os membros da Sociedade do Templo de Amon-Rá. Eles reivindicam ser a mais antiga das Fações e tem ligações com a cultura egípcia. São os mais obscuros das Facções e trabalham para manter o equilíbrio de poder entre elas, para que o Amanhecer ocorra normalmente. Eles são muito secretivos e místicos, e controlam várias seitas esotéricas e cultos. Seus membros são com frequência “magos” e outros tipos de pessoas ligadas ao esoterismo e aos movimentos de Nova Era.

Os Mercurianos, ou os membros da Ordem de Mercúrio são uma das mais poderosas e antigas Facções. Os Mercurianos entram fundo nos problemas humanos e tem uma predileção pelo controle político e econômico da sociedade mundana. Eles acreditam que precisarão dos Humanos para o Amanhecer. São inimigos dos Shaitans, e protegem a Lei do Silêncio.

Se o Osama Bin Laden fosse uma das marionetes das Fações, seriam os Shaitans que estariam por trás de suas ações. Os Shaitans (ou Al Shaitan) é a Fação mais extremista de todas, ligada ao Islamismo mas mais pelo poder político e religioso do que por alguma ligação espiritual. Eles acreditam que o Amanhecer só acontecerá se os Homens do Amanhecer atacarem diretamente os humanos, e atuarem objetivamente no fim da raça humana e no início da era do Amanhecer. Eles são os maiores rivais dos Mercurianos e são extremamente violentos e marciais em suas ações.

Fraternidade Sidharta (junto com os Shaitans), é a Facção que mais me interessou (se eu fosse fazer um personagem de CdA). Imaginei um monge fera em artes marciais (talvez com uma katana monstra) e com poderes psíquicos, atuando como um agente da justiça nos sórdidos conflitos entre as fações de CdA. Os Sidhartas tem a sua origem na Ásia e agem apenas quando sentem que o Amanhecer está em perigo. Dentre os seus membros temos monges, guias espirituais, defensores dos Diretos Humanos, membros de movimentos ecológicos, entre outros.

Os Zelotas seriam a mais poderosa das Facções. Também conhecido como o Partido Zelota, tem a sua origem no partido político judaico que lutava contra a dominação do Império Romano Tem uma enorme influência política e econômica no mundo, e acreditam que o Amanhecer tem que ser construído usando a Humanidade como instrumento. Eles manipulam todas as demais facções e além do poderio econômico, também se envolvem na política (nem que seja para ficar de olho nos Mercurianos). Em seus membros, os Zelotas contam com poderosos executivos, economistas, etc.

Senti falta de uma descrição dos Desgarrados, das Facções Locais e de algumas orientações para os mestres criarem suas próprias facções, o que poderia ser sanado com um netbook, quem sabe?

Regras: 

CdA usa as regras do sistema Ópera (que eu devo lançar uma resenha em breve). O nível de realismo de CdA (o sistema Ópera usa um esquema de níveis de realidade para campanhas de RPG, variando de acordo com o que o cenário pede, detalhando ou simplificando as regras para dano, combate, etc.). Temos também regras específicas para o cenário, com as Características Psíquicas e os Poderes Psíquicos.

As Características Psíquicas disponíveis para os Homens do Amanhecer são: Ampliação Mental (aumento do atributo Mente), Elo Mental (elo mental com uma pessoa, o que aumenta a telepatia, entre outras coisas), Escudo Mental (defesa contra ataques psiônicos), Percepção Extra-Sensorial (pré-requisito para outras habilidades), sendo que a Redução Mental (redução do atributo mente) seria apenas para os humanos normais.

Os Poderes Psíquicos disponíveis são: Controle Mental (controlar a mente do alvo), Intuição de Combate (forma de premonição direcionada para a luta), Percepções (perceber pensamentos e emoções),Precognição (visões de um futuro próximo), Psicometria (“ler” o passado com base em um objeto), Rajada Mental (danos na mente do adversário), Rastreio Psi (localizar qualquer pessoa ou objeto),Telepatia (comunicação mental).

O livro trás também todas as orientações para se montar personagens de CdA para o sistema Ópera e do modo como esses personagens podem ser balanceados com outros personagens que não são homens do amanhecer. Como o sistema Ópera é baseado em pontos, é fácil para um mestre que queira colocar humanos normais e Homens do Amanhecer em um mesmo grupo, com o mesmo nível de habilidades.

Campanhas:

Em seguida vem a parte que eu mais gosto em livros de RPG, as dicas para o Mestre. É interessante ver como o criador de um cenário visualizou o jogo, o clima, os tipos de aventuras, etc. Isso ajuda a variar o nosso estilo de jogo e muitas vezes fornece idéias originais e diferentes das que costumamos usar em nossos jogos.

No caso do CdA, temos as seguintes sugestões de aventuras: Humanos Normais x Facções (onde os jogadores seriam humanos normais que se envolveriam nos conflitos dos Homens do Amanhecer), ,Iniciação de Fogo (onde os PJs (Personagens dos Jogadores) são Adormecidos entrando para uma Facção), Treinamento de Campo (onde os “novatos” de uma Facção são lançados em uma missão para desenvolverem seus Poderes), Jogo de Influência e Manipulação (onde os PJs seriam envolvidos nos jogos políticos das Facções), Lei do Silêncio (onde os PJs tem que preservar a Lei do Silêncio, indo atrás de humanos ou Homens do Amanhecer que a estão quebrando), Desconhecido (onde algo misterioso está matando Homens do Amanhecer de Facções diferentes, e os PJs irão investigar).

No final do livro, temos uma pequena aventura introdutória ao cenário, escrita de maneira bem genérica, fazendo com que o mestre possa adaptar ao seu gosto, criando os PMs (personagens do mestre), os locais etc. Logo em seguida temos vários personagens de exemplo, o Opereta (um resumo das regras do Ópera) e a ficha de personagem do cenário.

Conclusões e Sugestões:

CdA é um cenário muito enxuto e bem construído. Com tantos anos de teste, de revisões e de desenvolvimento, as Facções estão bem construídas e prometem causar muita intriga nas campanhas. O clima de conspiração favorece à representação dos Jogadores e do Mestre, e um Mestre que seja especialista em “jogos mentais” vai fazer a festa com o cenário.

CdA pode (e deve) ser usado como um complemento para o cenário de horror contemporâneo que o Mestre esteja usando. As Facções podem ser um elemento novo e interessante em cenários como o Mundo das Trevas da White Wolf, o Trevas da Daemon, o Crepúsculo da Conclave, o cenário Imortal do Cláudio Muniz, e até mesmo em cenários de Supers (como o Avatar! deste que vos escreve!). Eu sempre falo que em um cenário contemporâneo, por mais poder que um personagem tenha, isso não é nada perto de pessoas que controlam o poder político e econômico. É o problema do Lex Luthor e do Super Homem, o Super pode jogar um navio na cabeça de alguém, mas o Lex Luthor é dono de uma frota inteira, e poderá processar o Super pegando até aquelas cuecas vermelhas que ele veste para fora da calça!

As Facções descritas no CdA tem muito poder dentro da sociedade humana, e serão um inimigo (ou aliado) poderoso em qualquer cenário de RPG contemporâneo.

Uma outra sugestão seria a ampliação dos poderes dos Homens do Amanhecer. No livro básico do Ópera tem outros poderes que podem ser utilizados juntos com o CdA. É claro, sempre respeitando a Lei do Silêncio.

Um maior aprofundamento no aspecto psíquico e psiônico também abririam grandes possibilidades para o cenário. É só dar uma lida na saga (fantástica e “embasbacante”) que o Grant Morrison está fazendo nos X-Man para ver que o campo da mente pode geras histórias fantásticas (como o combate com a Cassandra, o caso de adultério “mental” do Cíclope e da Jean Grey, entre outras coisas).

CdA é uma excelente pedida para a turma do horror contemporâneo, e a sua adaptação para outros sistemas é muito fácil de se fazer. E é claro, cada Mestre poderá adaptar a campanha ao seu gosto. Eu, por exemplo, criei um novo poder, descrito aqui para o Sistema Ópera (o * significa que pode ser comprado várias vezes, acumulando +1 em cada compra, com um limite do CdA de +6):

Explosão Cerebral * (4 PC)
Com esse poder psíquico, o Homem do Amanhecer pode causar danos na Mente do Adversário, se vencer uma Disputa de Vontade (ler Combates Mentais no CdA). 
Concentração: 2 rounds
Alcance: 10 metros/nível
Dano: 1d6 por nível (e a cada dano, veias na cabeça do alvo aparecem e fervem e se chegar a zero, a cabeça do alvo explode!)
Duração: Instantânea.

Pois é, de onde será que eu tirei a idéia para esse poder?

Escrito por Newton “Nitro”

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