The Mountain Witch RPG (resenha)

Um hábito saudável que eu possuo é o de não assistir televisão. Só ligo o aparelho para ver algum programa muito específico, como um filme ou jogo de futebol, e jogar video game.

Tal costume acaba causando alguns transtornos em meu convívio pessoal. Eu não sabia o que era uma tal de Casa dos Artistas e nem Big Brother. Conversas sobre Pânico na TV, Dança dos Famosos e outros concursos similares eram totalmente improdutivas.

Porém, nem todos os concursos são inúteis assim. Há alguns anos ocorreu um concurso idealizado pelo portal FORGE, chamado IGC RPG, onde o desafio era escrever um jogo de RPG em uma semana, incorporando no mínimo três dos seguintes temas: gelo, nascer do sol, ilha e invasão. E um dos frutos deste concurso foi o The Mountain Witch.

O Jogo

The Mountain Witch reúne os temas exigidos para o concurso de forma bem criativa: os jogadores interpretam um grupo de samurais em um Japão feudal (terra do sol nascente = nascer do sol), que são incumbidos de invadir (= invasão) uma fortaleza onde mora uma poderosa bruxa, localizada no Monte Fuji (= gelo).The Mountain Witch cover

Os personagens, assombrados pelo seu passado e segredos sombrios, se encontram em uma situação desesperadora. Apesar de seus motivos serem totalmente diferentes, eles se encontram sob o risco de perderem tudo. Somente o pagamento desta missão pode restaurar a esperança e reganhar um pouco do que eles perderam. Porém, poderão esses homens, podendo ganhar ou perder tudo na vida, serem confiáveis? Poderão eles superar as suas diferenças e em conjunto derrotar a Bruxa? Ou eles permitirão que um destino sombrio recaia sobre eles?

A jornada através da montanha gelada será repleta de obstáculos, tanto naturais, como o relevo e o clima, quanto asseclas enviados pela Bruxa. Porém, um dos maiores inimigos pode estar bem ao seu lado: um dos diferenciais do TMW é a utilização de uma mecânica de confiança entre os personagens, chamada de Trust, que proporciona bons momentos.

Além disso, no começo da aventura cada jogador recebe em segredo um cartão com o Dark Fate, ou Destino Sombrio, muito parecido com os objetivos do jogo de tabuleiro War. Neste cartão estão contidas instruções bem vagas sobre o destino que recairá sobre o personagem durante a aventura, o que estabelece de certa maneira a conduta que o mesmo deve assumir durante o jogo. Os Destinos Sombrios pré-fabricados são: Desesperadamente Apaixonado, Aliança no Passado, Vingança, Motivos Excusos, Pacto Profano e Pior Medo.

Outro aspecto interessante presente na narrativa de TMW é a sugestão da divisão da aventura em atos e capítulos bem definidos. O Ato I é chamado de Introduction, e é onde o início da trama e os personagens são apresentados. Este Ato começa com os samurais no sopé do Monte Fuji, logo após o entardecer. O objetivo aqui é entrar na fortaleza, fato que marca o início do Ato II.

Já o Ato II: Building Tension, é marcado pela exploração da Fortaleza. A presença da Bruxa já pode ser sentida, como forma de explorar superficialmente os Destinos dos personagens. Aqui também começam mais profundamente as relações de Trust.

A exploração profunda dos Destinos Sombrios e suas consequências ocorre no Ato III: Fates Revealed, onde todos os destinos são totalmente revelados. Já no último Ato: Conclusion temos o conflito definitivo com a Bruxa, assim como a resolução de todos os Destinos Sombrios. Esta divisão acaba facilitando a vida do Mestre, porém pode deixar a aventura com um aspecto extremamente linear.

O Sistema

A criação de personagens em TMW é extremamente simples e rápida. Começa com o sorteio/definição dos Dark Fates, passando pela escolha do zodíaco do Samurai, entre os 12 disponíveis. Após isto, ainda deve-se escolher 3 habilidades, que são simplesmentes descrições de coisas que você consegue fazer bem, sem níveis ou similares. Após responder duas questões de background e distribuir os pontos de Trust (que são estabelecidos inicialmente através das relações entre os zodíacos) o seu samurai está pronto para o jogo. Não existem atributos.The Mountain Witch 2

O sistema de jogo é o mais simples possível: cada parte envolvida em um conflito rola 1d6: o maior resultado ganha. Existe ainda o chamado grau de sucesso, que é a diferença numérica entre os rolamentos, que é utilizado para estabelecer o dano causado e o nível de efeito obtido. É tudo bem simples e funcional, sem comprometer o desenrolar da trama.

O biscoito fino está na mecânica de Trust: pontos desta característica podem ser utilizados para ajudar um companheiro em um conflito (adicionando 1d6 ao rolamento); comprar direitos de narrar a resolução do conflito; ou utilizar como bônus para traição, atrapalhando os resultados de quem você não confia.

Como dito antes, o nível de Trust inicial é estabelecido pelo zodíaco dos personagens. Após cada capítulo, este nível pode ser alterado de acordo com a confiança que foi obtida (ou perdida) através do relacionamento entre os personagens durante a aventura. Sem dúvida alguma esta mecânica pode adicionar situações muito interessantes ao jogo, ainda mais se utilizado por um grupo experiente.

O Livro

The Mountain Witch é apresentado em um extenso arquivo em .PDF de 164 páginas dividido em 5 capítulos: Introduction, Mechanics (onde temos o sistema de jogo), Character Creation, The Adventure (onde existem os pormenores pertinentes à aventura, como localidades, criaturas, etc.), e Playing the Game, com os detalhes da utilização de Trust e Dark Fates. Ainda existem três extensos apêndices, sendo um deles de utilidade duvidosa, contendo uma enorme quantidade de nomes japoneses… Em outro temos um boa e diversificada lista de referências, com filmes, livros e HQ’s.

Na parte gráfica, poucas figuras enfeitam as páginas do livro, inclusive algumas muito boas, coloridas entre os capítulos. Bonitas mesmo. Porém, a diagramação é pessimamente executada, com fontes de tamanhos diferentes no mesmo parágrafo, boxes e colunas laterais invadindo o texto principal e quebras de páginas desordenadas. A confusão é tamanha que chega até mesmo a atrapalhar a compreensão do conteúdo. Uma pena.

A planilha é bem limpa e organizada, assim como um resumão das regras, que ocupa apenas uma única página. É realmente muito útil.

No final do dia, temos um jogo de RPG com uma faca de dois gumes, onde as suas maiores qualidades podem se tornar defeitos inconcebíveis. As excelentes mecânicas de Trust e Dark Fates representam o ápice do sistema, porém podem ser utilizadas de forma dúbia e arruinar com a aventura, se conduzidas por jogadores inexperientes ou sem a devida inspiração e boa-vontade. O mesmo pode ser dito sobre a temática do concurso, que provoca o enfoque da aventura no assalto ao Monte Fuji: o que a primeiro momento é interessante, pode se tornar repetitivo e previsível.

E como diria um amigo meu – “A TV é muito educativa. Toda vez que alguém a liga, eu vou para outro cômodo e abro um livro”.

Por Clayton Mamedes

Notas (de 1 a 6)
Layout/Arte:
3 (belas imagens com uma diagramação péssima);
Texto: 4 (boa quantidade de informações, inclusive de inimigos e criaturas);
Conteúdo: 5 (mecânicas inovadoras, mas pode tornar-se repetitivo);
Notal Final: 4

Ficha Técnica:
The Mountain Witch
Por Timothy Kleinert, 2005 – 164 páginas em .PDF

www.indiepressrevolution.com

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Essa resenha de “The Mountain Witch” foi publicada originalmente no antigo portal em 21 de novembro de 2009 e teve 934 leituras.

The Mountain Witch

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