O RPG como ferramenta lúdica: Jogos e interdisciplinaridade a favor da aprendizagem

Através do lúdico, ou seja, de jogos com caráter de ensinar seus jogadores algum tipo de conhecimento ou habilidade, é possível aumentar a experiência de ensino aprendizagem indo além dos limites normalmente estabelecidos em sala de aula e aumentando o interesse das crianças pelos mais variados assuntos, entre eles algo que é fundamental para um bom desenvolvimento: a leitura como prática corriqueira e incorporada ao dia a dia.

Isso pode ser feito com jogos feitos para esse fim, assim como adaptando jogos feitos pela indústria do entretenimento esperando chegar a esse resultado. Algumas das vantagens e desenvolvimentos esperados, para as crianças que tiveram contato com o RPG, o Roleplaying Game, o também conhecido jogo de interpretação, serão mostradas a seguir. Os professores podem usá-los para incrementar o seu aprendizado e sua interatividade social, aplicando estes conhecimentos que envolvem desde técnicas teatrais ao artesanato de miniaturas e sendo colocados nestas situações que instigam sua imaginação, agucem sua memória. Através de ferramentas, regras e sistemas de jogo, as crianças tornam-se mais capazes de resolver situações-problema, tomar decisões, criticar e questionar o que acham incorreto, incoerente ou inconsistente e de confrontar suas argumentações aprendidas e vivenciadas. O objetivo é melhorar a aprendizagem em um ambiente descontraído e capaz de desenvolver e ampliar as habilidades das crianças tornando-as mais seguras e tranquilas no momento de tomar decisões e fazer escolhas, tanto para situações imediatas, quanto para analisar escolhas futuras. Isto não vale apenas para crianças, mas também para jovens e adultos que pretendem usar desta maravilhosa ferramenta de forma lúdica em seus estudos e recreações.

Faz-se necessário também explicar as palavras que compõem nosso título: lúdicos são jogos que têm como função promover algum tipo de ensinamento através da diversão, com o intuito de aumentar os conhecimentos e nossa bagagem cultural, através da experiência didática das crianças ou adultos em suas devidas faixas etárias, que revelam o movimento existente na interação dentro do jogo, em que as ações de umas refletem resultados nas ações das outras através do jogo de papéis. Já a sigla RPG – Roleplaying Game, em uma tradução livre significa Jogo de Interpretação onde o limite acaba sendo única e exclusivamente a imaginação dos jogadores.

Muitos jogos criados pelas indústrias atualmente, têm a função lúdica e, há jogos que podem ser usados com esse efeito, se devidamente utilizados, como por exemplo: o clássico Banco Imobiliário (adaptado do jogo norte-americano Monopoly). Se utilizado por educadores da área de matemática, pode promover contas simples e até mesmo cálculos complexos, além de ensinar finanças ainda que em níveis elementares às crianças, mostrando a relação de locador e locatário nos imóveis. Por conter em suas regras estas relações comerciais, assim como as relações de compra e venda, que fazem parte integrante da composição do jogo, onde o vencedor é aquele que conseguir acumular o maior número de imóveis, empresas e dinheiro.

O RPG, em suas várias modalidades, se utiliza das mais diversas ferramentas didáticas e, pode ser usado como lúdico com extrema facilidade, em qualquer área que o profissional da educação atue, precisando apenas de pequenas adaptações para cada uma. E mesmo os pais e estudantes com pouco esforço podem tornar temas das aulas de história, participações épicas de interação e aprendizagem.

O benefício de tais jogos de RPG depende de como eles são aplicados, algumas das mais notórias, o desenvolvimento do raciocínio lógico para resolver um evento proposto em várias sessões do jogo; aumento da capacidade de interação social por meio de atividades em grupos feitas a partir de técnicas básicas de interpretação com inspiração em autores teatrais como Constantin Stanislavski e Jerzy Grotowski; incentivo à leitura, pois quanto mais se conhece, mais se domina o assunto, dessa maneira os alunos e qualquer pessoa, se sentem compelidos a ler mais e o que é mais importante, por conta própria; estimulo a criatividade inerente, pois nos sistemas de jogo, vários ambientes podem ser construídos, dentre eles os mais interessantes são ambientações históricas, inserindo os jogadores como pessoas que estão no fato histórico narrado, aumentando sua compreensão do acontecido como um agente ativo do procedimento histórico; estímulo à competitividade esportiva, e valorização do “Fair Play” (jogo limpo), tornando-os mais responsáveis e aplicados; identificação geográfica, pois muitos mapas são usados no processo. Enfim a aplicação destas técnicas visa aumentar ao máximo o aproveitamento acadêmico, através de uma veia educativa e divertida.

Métodos de trabalho por área: Desenvolvimento do raciocínio lógico

A lógica, apesar de ser simples em vários aspectos de nossa vida, às vezes se apresenta confusa para crianças e jovens que estão muito acostumados a não ter de usar a imaginação, pois a versão da verdade dada pela TV e pelos jogos eletrônicos é prontamente aceita. Um bom exemplo de que tudo é aceito ou visto como verdade pelas crianças e jovens se apresenta no que eles comem, pois jamais se interessam pelos ingredientes que compõem o prato. Eles apenas comem ou recusam.

As ferramentas utilizadas para isso são os jogos de mesa, que podem tratar de qualquer assunto requerido como, por exemplo, os jogos de interpretação com fundamentação histórica, levando as crianças que podem ser de dez anos até mesmo adultos, a vivenciar situações históricas como a chegada das embarcações de Pedro Álvares Cabral ao litoral brasileiro.

Outra importante ferramenta no processo de incremento do raciocínio são os jogos de xadrez, que aumentam esta capacidade Os benefícios deste jogo centenário e as práticas de como o mesmo se aplicam em escolas (Caldeira 2009), mostram que o jogo permanece arrojado e diferente da maioria dos outros jogos, se baseia única e exclusivamente na capacidade individual, visto que não depende de sorte.

Aumento da capacidade de interação social

Muitas crianças e jovens são extremamente tímidos, a ponto de só se comunicarem em seu convívio social através de meios secundários de interação, sendo o principal deles a internet e atualmente seus aplicativos de smartphones.

Esses exercícios aplicados têm o intuito de trazê-los ao convívio físico, de mostrar suas opiniões junto com seu rosto, e não se esconder-se através de um “Nick”. Para isso, noções de interpretação teatral podem ser dadas para que todos possam saber que mesmo estando de frente a uma pessoa, isso não quer dizer que ela irá prejulgá-lo por aquilo que ela pensa que a criança ou o jovem seja.

Excelentes escolhas para isso, são técnicas de autoconhecimento e de autores renomados do teatro como Constantin Stanislavski e sua teoria aplicada da “Fé cênica” (Stanislavski 2014) onde a principal tarefa é encarnar o personagem, no caso a si mesmo, sem se restringir no processo. Outro autor teatral muito recomendado, é Jerzy Grotowski, que fundamenta sua teoria no “Teatro Pobre” (Grotowski 1971) o que instiga a imaginação e a composição a ser feita, visto que esta teoria prega que o ator, que no caso é o jovem ou a criança nestes exercícios, não se importe com figurino, ou objetos para ajudar em sua performance, visto que o importante já pertence ao jovem ou criança, que é o próprio corpo.

A ferramenta do RPG para práticas de teorias teatrais, é conhecida como “Live Action”, um tipo de jogo onde o personagem se veste, quando é necessário um figurino adequado, e interpreta como se fosse o personagem, no entanto, sem um texto, sabendo apenas de suas emoções e motivações, tenta adequar a prática exigida, suas vivências próprias e as técnicas aprendidas para uma vivência muito próxima do que é uma apresentação teatral na base do improviso.

Incentivo à leitura

Sabe-se que, com o fácil acesso aos meios de comunicação, a leitura a cada dia vem sendo deixada de lado, com exceção de algum livro que possa ficar famoso para a faixa etária, a grande maioria é simplesmente desconhecida e abarcada no contexto do chato e obsoleto.

Com a participação nos jogos, a leitura é incentivada, pois quanto mais se conhece de um assunto que nos agrade, mais iremos ler sobre este referido assunto, e com isso habilidades importantes para o futuro podem ser precocemente identificadas e maximizadas. Todas as ferramentas dos jogos de RPG podem gerar este efeito, visto que o conhecimento sempre é buscado, quando se quer a resolução de um problema.

Estímulo à criatividade inerente

Sabe-se que a criança e o adolescente possuem grande criatividade que pode e deve ser desenvolvida e incentivada, mas que na medida em que o ser humano se desenvolve principalmente em âmbito profissional, a criatividade às vezes é deixada de lado, devido a determinadas especificações do trabalho, mas quanto mais valorizada a criatividade pessoal, maiores as chances da criança e do jovem manterem esta criatividade até a vida adulta.

Um dos objetivos é explorar essa criatividade, pois as crianças terão de imaginar seus personagens ou a si próprias, em situações cotidianas como, por exemplo: como é o dia a dia deles, como pensam, qual a motivação de ir a determinados lugares, etc. Isso traz muitas soluções para a vida real, quando devidamente aplicadas e, o principal fator, a imaginação não pode ser presa ou limitada, a não ser que a criança queira ou seja necessário que se imponha limites, de acordo com cada atividade aplicada. O desenvolvimento de atividades simples e complexas que podem ser resolvidas com trabalhos individuais ou em grupo também é um fator muito importante para que a criança e o jovem possam desenvolver sua autonomia e convívio social e cooperação, quando forem necessários trabalhos em grupo para o estímulo da interatividade social, essa é uma boa prática também para grupos corporativos com muitos indivíduos.

Estímulo à competitividade esportiva

A ciência já atestou os benefícios trazidos pela prática de esportes, mesmo que nem todos os esportes sejam meramente físicos, como os estudos embasados no uso do RPG e a própria dinâmica do mesmo.

Apesar de os esportes mentais em nosso país, como o xadrez, que é nosso principal exemplo, têm pouco reconhecimento e são pouco valorizados, fazendo com que seu número de praticantes não seja tão elevado quantos outros esportes mais populares, ou do gosto geral do brasileiro como o futebol. No entanto, todas as pessoas que praticam as atividades e jogos como o xadrez e o RPG, são pessoas que normalmente são mais aptas a desempenhar funções intelectuais em suas formações futuras.

Como também o próprio esporte já traz a competitividade, com a devida instrução, dar noções muito claras de cidadania e respeito aos indivíduos. Além da capacidade de resolver problemas e situações problemas com o aumento do raciocínio como foi comentando anteriormente. Os cardgames e também os boardgames, que abordam várias temáticas dentre elas podemos destacar o uso de personagens históricos que não viveram na mesma época, mas que em um destes jogos podem se confrontar de lados opostos, como por exemplo Ramsés II e Gengis Khan, no jogo que tem a tradução literal de “Anacronismo”. Como a maioria dos jogos competitivos, visa declarar um dos participantes ou um dos grupos como vencedor.

Identificação geográfica

Esta é uma parte específica do trabalho que faz com que os jovens e as crianças precisem de mapas para se localizar em todos os locais. Isto faz com que desenvolvam a capacidade de analisá-los, além de capacitá-los para a leitura e interpretação de gráficos, mapas e que aprendam a importância da legenda usada no material cartográfico.

Apesar de muitas dificuldades, a boa vontade em perpetrar inovações para os sistemas de ensino e aprendizagem ainda podem e devem ser criadas, e destas experiências, principalmente quando se tem a oportunidade de colocá-las em uma avaliação empírica e participativa a experiência demonstra seus atrativos e recompensas.

Autor: André Luís Coelho Teixeira
Equipe REDE
RPG

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4 Comments
  1. Muito interessante o texto. É bom ver que existem mais pessoas trabalhando os lados positivos do RPG em vez de demonizá-lo perante a mídia.

    Apenas gostaria de frisar um detalhe: quando vocês se referem a “lúdico”, há um detalhe que precisaria ser arrumado. Lúdico diz respeito ao jogo, ações que visam ao prazer de quem as pratica. Pode existir aprendizagem aliada ao lúdico, mas não é uma relação de causa e efeito, ou seja, lúdico não diz respeito a “aprender jogando”, mas, simplesmente, “jogar”.

    Ademais, gostaria de parabenizá-los pela divulgação do RPG e por todo trabalho realizado em torno dessa prática que pode ser tão proveitosa para a nossa sociedade.

    Abraços!

  2. Pingback: RPG e Educação

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