O Homem do Crepúsculo

Desde que eu era criança, eu ouço vozes. Eu ouço o que as pessoas dizem, mas não têm coragem de falar. Isto me criou situações complicadas, e um dia meus pais me levaram a um psiquiatra. Fiquei alguns meses tomando remédios que me feriam a alma, e que me curaram da minha real sanidade. É claro que algumas semanas depois que os remédios foram suspensos as vozes voltaram, e logo depois voltaram os remédios, e eu novamente passei vários meses tendo minha alma ainda mais dilacerada por aquilo que diziam ser a minha cura.

Da segunda vez que suspenderam as medicações, eu já era um pequeno jovem e decidi mentir sobre o que eu ouvia, para nunca mais visitar o inferno criado por meus pais para que eu fosse o filho normal que eles gostariam de ter tido.

Por toda minha adolescência eu sufoquei as vozes, até que um dia eu consegui não escutá-las mais. Eu sabia que no fundo ainda poderia ouvi-las, mas consegui me enganar de que elas não existiam. Até que um dia elas explodiram em minha mente e eu não podia mais calá-las.

Porque desta vez foi diferente. Minha mente um dia gritou, um grito sem som que eu havia sufocado por anos. Só que outros ouviram e me responderam.

Então eu descobri que não estava sozinho, e eles vieram atrás de mim.

Mas como fugir do que parece estar dentro de você? Era como tentar fugir do que você é e eu já estava cansado de fugir de quem eu realmente era.

Inevitavelmente eles me acharam como o oceano acha o rio quando o rio finalmente chega a seu desaguar.

Eles eram muitos e guerreavam entre si. Julgavam-se senhores do mundo e queriam ser senhores de mim. A palavra medo agigantou seu significado para mim. E outros surgiram, e todos tinham seus próprios nomes. Eles são facções de um mesmo terror e desta vez nem os remédios poderiam me proteger deles.

Eles me deram um título, um rótulo: “desgarrado”. Descobri que havia outros como eu por aí, mas nenhum dos que eu encontrei quis me ajudar, porque fazer as Facções irem atrás de mim era a melhor chance de cada um deles fugir delas. E por fim eu descobri que havia coisas ainda mais aterradoras do que as Facções, e para eu não me tornar algo que não seria mais eu, preferi fugir para a Morte e tirei minha própria vida.

Mas foi aí que minha nova existência começou. Talvez minha verdadeira existência.

Não há mais drogas, não há mais corpo, não há mais medo ou dor.

Agora, eu serei o terror e terei minha vingança contra todos eles.

Por Marcelo Telles

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