O Novo Mundo das Trevas (resenha)

O Mundo das Trevas – Livro de Regras do Sistema Storytelling, lançado pela Devir, é o livro básico do novo Mundo das Trevas. Diferente do antigo, onde cada livro sobre um tipo de criatura (Vampiro, Lobisomem, Mago, Changeling, etc) continha todas as regras (e as discrepâncias de sistema entre cada criatura), o jogador precisa comprar este livro para poder jogar os novos Vampiro, Lobisomem e Mago: agora você cria um personagem mortal pelas regras contidas neste livro básico e depois adiciona o “modelo” de criatura sobrenatural que vem em cada um dos outros livros.

Alguns ainda podem estar torcendo o nariz por conta disso, e se recusando a experimentar o novo Mundo das Trevas. Mas podem ter certeza que vocês não vão se arrepender: o livro básico talvez seja até o melhor dos novos livros. Vocês podem vir a não gostar dos novos Vampiro, Lobisomem, Mago, etc, e continuar jogando os antigos, mas este livro básico vale muito a pena.MdT_Basico

Além de apresentar o novo sistema Storytelling, uma versão melhorada e infinitamente superior ao velho Storyteller, O Mundo das Trevas é um manual sobre RPG de horror moderno, trazendo orientações e recursos para qualquer tipo de campanha deste gênero. Com ele é possível jogar desde adaptações de séries como Nightstalker (remake de “Kolchak e os Demônios da Noite”, na qual se baseou Arquivo X), Sobrenatural (Supernatural), Poltergeist: O Legado e Arquivo X; até aventuras de outros cenários de RPG, como Call of Cthulhu, Trevas e Crepúsculo.

O livro em si possui um prólogo e oito capítulos e mantém a tradição de alta qualidade gráfica e de arte da White Wolf. O prólogo é um conto ilustrando a imersão de uma pessoa comum no Mundo das Trevas.

O capítulo 1 é o melhor do livro. Ele é o capítulo de ambientação, mas ao invés de trazer um resumo da descrição do cenário, ele traz vários “cenários”: são contos de estilos e temas variados dentro do gênero horror/sobrenatural. Eles mostram que, embora o Mundo das Trevas seja em princípio um cenário específico com as suas criaturas sobrenaturais características, você pode simplesmente ignorar os livros sobre essas criaturas sobrenaturais e jogar com o “seu” Mundo das Trevas: qualquer cenário ou ambientação que você escolher ou criar. Inclusive fica a dica para os amantes do velho Mundo das Trevas: joguem com a velha ambientação e suas criaturas, mas adaptem o velho Storyteller para o novo Storytelling.

Complementando o capítulo 1, temos um resumo das regras, o básico sobre a criação de personagens, um glossário com os termos do sistema de jogo, e um resumo dos principais testes e características.

Do capítulo 2 ao capítulo 7 temos os detalhes do sistema Stoytelling. Pela ordem dos capítulos temos: atributos, habilidades, benefícios, vantagens, sistemas dramáticos (todas as regras, exceto as de combate) e as regras de combate.

Os atributos e habilidades sofreram pequenas mudanças nos nomes em relação ao antigo sistema, talvez alguns possam parecer um pouco estranhos, mas nada muito relevante. Nos atributos, ao mesmo tempo em que temos a velha divisão entre atributos mentais (Inteligência, Raciocínio e Perseverança), físicos (Força, Destreza e Vigor) e sociais (Presença, Manipulação e Autocontrole), temos também a divisão pelo tipo de uso ao qual cada um se relaciona: Poder (Inteligência, Força e Presença), que é o efeito que o personagem produz nas pessoas e no ambiente; Refinamento (Raciocínio, Destreza e Manipulação), que é a capacidade de interagir com o mundo e influenciar as pessoas; e Resistência (Perseverança, Vigor e Autocontrole), que indica como o personagem lida com influências externas e internas capazes de afetá-lo adversamente.

Cada atributo e habilidade são minuciosamente descritos, com direito a um pequeno conto para cada um e os testes mais comuns em que são usados, explicados de maneira muito detalhada.

Nos benefícios temos nossa velha conhecida Força de Vontade, além de novas características e antigas características redefinidas. São elas: Moralidade (no lugar da Humanidade), Defesa, Deslocamento, Iniciativa, Tamanho, Vitalidade, Perturbações, e Virtudes e Vícios.

As Virtudes e os Vícios são o grande destaque deste capítulo, sendo baseados, respectivamente, nas Sete Virtudes Cardeais (Caridade, Esperança, Fé, Fortaleza, Justiça, Prudência e Temperança) e nos Sete Pecados Capitais (Avareza, Gula, Inveja, Ira, Luxúria, Orgulho e Preguiça). Eles substituem a Natureza e o Comportamento, e possuem uma mecânica mais clara para a recuperação de pontos de Força de Vontade. Uma dica é continuar usando também a Natureza e o Comportamento como referência de interpretação, complementando a Virtude e o Vício do personagem, mas apenas estes últimos para recuperar Força de Vontade.

As Vantagens substituem os Antecedentes e as Qualidades do Storyteller, e incluem os estilos de arte marcial.

O capítulo sobre sistemas dramáticos explica em detalhes o novo sistema Storytelling. Ele é um sistema mais coerente e eficiente que o seu predecessor e, principalmente, não tem os “bugs” probabilísticos do Storyteller.

Todos os testes continuam sendo uma parada de dados de 10 faces, determinada pela soma de um atributo com uma habilidade, onde o total indica a quantidade de dados a ser jogada. A parada de dadas é modificada por eventuais bônus (que adicionam dados) e depois por eventuais penalidades (que subtraem dados), sempre nesta ordem. A parada final é jogada e todos os testes têm um número-alvo fixo para os dados: 8 ou mais é um sucesso. Basta um sucesso (um único dado com resultado 8, 9 ou 10) para o teste ser bem sucedido. Cinco ou mais sucessos são um “êxito excepcional”, que concede efeitos positivos extras ao teste.

Além disso, há agora a regra da “explosão do 10”: todo dado jogado que obtiver o resultado 10 tem seu sucesso computado e é jogado novamente. No caso de um novo sucesso, ele é somado no resultado da ação e, caso esse novo sucesso seja novamente 10, ele será somado e jogado novamente. E assim continuará enquanto se obtiver algum resultado 10.

Já a falha dramática só acontece no caso de um resultado 1 em um teste de sorte. Um teste de sorte é quando a parada de dados é reduzida a zero ou menos dados a serem lançados (sim, pela aplicação de penalidades, pode se ter uma parada de zero dado ou mesmo negativa). Nestes casos, o jogador tem direito a um teste de sorte (se quiser): ele jogará um único dado, mas se o resultado for 1, além da falha, algum efeito negativo a mais acontecerá… Ao contrário dos testes normais, um teste de sorte só será bem sucedido se o resultado do dado for 10, mas ele também se beneficia da regra da explosão do 10. Apenas no primeiro dado jogado do teste de sorte um resultado 1 será uma falha dramática.

O capítulo com as regras de combate tornam o novo sistema mais complexo que o Stoyteller, mas a coerência e a lógica do Storytelling mais que compensam esse aumento na complexidade desta parte.

O último capítulo, sobre narrativa, traz orientações e dicas de como conduzir um jogo ou campanha no Mundo das Trevas. Nenhuma grande novidade para Narradores experientes com o gênero horror e que tenham acesso a livros importados, mas um bom capítulo de qualquer jeito.

A versão traduzida da Devir tem pequenos deslizes de revisão, mas nada que comprometa muito. De modo geral, o livro está acima da média de outras traduções, mérito da Maria do Carmo Zanini, que há algum tempo vem cuidando da parte de Mundo das Trevas da editora (tanto do antigo, quanto do novo).

O balanço final é de um excelente livro, bem feito, bem escrito, trazendo um excelente sistema. Mais do que o livro básico do novo Mundo das Trevas, ele é um belo manual para campanhas de horror moderno.

 

Por Marcelo Telles
Coordenador da REDERPG

Notas (de 1 a 6)
Layout/Arte: 5
Texto: 5
Conteúdo: 5
Nota Final: 5

Comparação entre a capa da primeira e da segunda impressão em português

Comparação entre a capa da primeira e da segunda impressão em português

 

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Essa resenha foi publicada originalmente no antigo portal em 23 de março de 2007, onde teve 6.199 leituras.

 

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