Arquivo REDERPG: Como transformar números em um personagem (parte III)

Como transformar números em um personagem foi um artigo em três partes de Scott Holden-Jones, que Claudio Pozas conseguiu para a REDERPG a autorização da Fiery Dragon para traduzirmos. Confiram a seguir a primeira parte do artigo (1.195 leituras), traduzido pelo Tzimisce e publicado no antigo portal em 28 de setembro de 2003.


 

Claudio Pozas conseguiu para a REDE RPG a autorização da Fiery Dragon para traduzirmos o artigo em três partes de Scott Holden-Jones, “Como transformar números em um personagem”. Leia agora a terceira parte do artigo, traduzido pelo Tzimisce.

Como transformar números em um personagem III

De Atributos e Antagonistas

Vejamos, seu lich tem Inteligência 29, Sabedoria 14 e Carisma 17, mas você não sabe como tornar isso óbvio para seus jogadores? Quero dizer, como um cadáver ambulante poderia ter Carisma 17? Cadáveres não são bonitos! E o que exatamente aquela Inteligência 29 faz por ele (ou para qualquer um por falar nisso) no final das contas?

Bem, aqui vai uma dica: se você usa monstros com Inteligência 2 da mesma maneira que usa aqueles com Inteligência 10, então os com 19 e 29 vão acabar parecendo iguais também.

Representar com exatidão a Inteligência de um personagem ou monstro poder ser um dos grandes desafios do RPG, tanto como jogador quanto como mestre. No entanto, existem algumas táticas que você poder usar para simular atributos mentais altos ou baixos e a maneira como eles se relacionam.

Inteligência é sempre tratada como o único e mais determinante atributo para estabelecer o comportamento de criaturas em D&D (junto, claro, com o artificial conceito de “tendência”), sendo que Sabedoria acaba ficando com uma posição secundária. Carisma costuma ser relegado para uma espécie de “passiva” terceira posição; jogadores (e criadores de jogos) acabam pensando nele simplesmente em termos de atração e persuasão – i.e., na maneira como o personagem é percebido por outros – ao invés de usá-lo num papel mais ativo. Assim, personagens espertos aplicam o intelecto em seu benefício, resolvendo problemas e aperfeiçoando perícias e técnicas, enquanto que um personagem carismático colhe os benefícios de um Carisma alto apenas no simples ato passivo de ser apreciado pelas outras pessoas… eles simplesmente são carismáticos.

Lembre-se, no entanto, que nenhuma habilidade existe num vácuo – um baixo Carisma de um personagem vai influenciar como ele usa sua Inteligência, por exemplo, enquanto que uma boa Sabedoria vai tanto direcionar como ser direcionada pela Inteligência e pelo Carisma. Vamos dar uma olhada em algumas das maneiras em que habilidades elevadas podem ser relacionar:

  • i. Inteligência alta amplia e complementa a natural (auto-)percepção que vem junto com uma Sabedoria elevada. Um personagem esperto e sábio, através das evidências físicas percebidas por seus sentidos acurados, faz rapidamente deduções práticas e precisas a respeito delas. A maioria dos inventores de primeira qualidade e escritores qualificados, por exemplo, provavelmente tinham valores razoavelmente altos tanto em Inteligência quanto em Sabedoria.
  • ii. Um personagem muito inteligente com um alto Carisma é autoconfiante e atraente (não necessariamente atraente no sentido físico, mas talvez tendo uma certa qualidade de je n’sais quois), com um charme dignificado que faz com que sua mente ágil seja visivelmente perceptível. Pessoas o respeitam tanto por seu raciocínio quanto por sua personalidade.
  • iii. Um personagem bem carismático com uma alta Sabedoria está sempre “antenado” – ele é altamente atento aos seus arredores, e pode estender sua percepção para outros igualmente, lendo pessoas como se lesse um livro. Ele pode inclusive ser bem visto pois sua Sabedoria lhe indicaria quando ele deveria falar e quando ele deveria calar-se.

As inter-relações acima certamente não são as únicas, mas apenas alguns exemplos dentre um número infinito de possibilidades. Portanto, um personagem sábio e carismático poder ser admirado muitas vezes por ser atencioso, controlado e reservado, enquanto que outro por ser franco e extrovertido, sempre sabendo a coisa certa a falar para fazer com que as pessoas ao seu redor riam. O “truque” é simplesmente descobrir como duas habilidades podem ser relacionar, e então transformar essa idéia num traço de personalidade.
Em termos de controlar PdMs, mantenha as seguintes idéias na cabeça:

  • iv. Um PdM com Inteligência alta tende a usar palavras grandes e/ou obscuras (apesar de que isso pode ser tanto uma questão de criação e educação, quanto de um simples intelecto elevado); ele irá sempre encontrar, ou se sentir impelido a encontrar, respostas ou soluções para as perguntas e situações que outros simplesmente aceitam como fato.
  • v. Um PdM com uma Inteligência baixa irá sempre falar de maneira simples e freqüentemente se confundira em conversações rápidas ou sagazes (sempre perdendo “o sentido da piada”); indo além, ele pode usar ou pronunciar palavras incorretamente e, em muitos casos, pode ter dificuldade para entender simples problemas ou para interpretar sinais básicos, símbolos e linguagens.
  • vi. Um PdM com uma Sabedoria alta pode ter uma boa dose de “bom senso” e irá geralmente permanecer calmo, centrado ou “sob controle” sob a maioria das circunstâncias; ele sempre terá uma intuição sobre os desejos das outras pessoas. Em casos de Sabedoria extremamente alta (20+), observadores normais, incluindo outros PdMs em torno do personagem, podem perceber essa sensitividade ou intuição como algo beirando pré-cognição ou o sobrenatural.
  • vii. PdMs com Sabedoria baixa são geralmente imprudentes, precipitados ou apressados, e podem de outra maneira serem levianos ou imaturos. Mesmo se inteligentes, eles podem parecer “entorpecidos” ou lentos.
  • viii. PdMs com Carisma elevado tendem a ser atraentes, sociais e/ou sisudos; alternativamente, eles podem fazer usos calculados ou intuitivos de frases, maneirismos e ações parecidas que os façam parecer mais intrigantes para outras pessoas.
  • ix. Aqueles com baixo Carisma tendem a ser por demais chamativos e/ou intrusivos, ou ainda extremamente reservados – a ponto de parecem excluídos ou mesmo “esquisitos”.

Em termos de PdMs vilões (ou pelo menos oponentes para os jogadores), mantenha as seguintes coisas em mente:

  • x. Inteligência dita a habilidade de alguém planejar e se organizar; está diretamente relacionada à velocidade de raciocínio (i.e., o quão rápido a mente reage a novas informações) e à habilidade de analisar situações objetivamente. Não tenha medo de dar a um PdM vilão um teste de Inteligência (CD determinada pelo mestre) que lhe permita reagir às reações dos jogadores como se ele já as estivesse esperando – até mesmo, eu poderia sugerir, a ponto de alterar magias preparadas para contra-atacar situações criadas pelos jogadores.
  • xi. Sabedoria tem a ver com a consciência de si mesmo, prontidão, força de vontade e percepção das ações tomadas por outros. Essas características podem ser usadas mecanicamente através de perícias como Observar, Ouvir, Sentir Motivação, e em testes de Vontade, portanto use essas regras para simular livremente as aptidões do PdM. Continuando com o exemplo acima, você pode permitir que um PdM com uma alta Sabedoria faça um teste de Sentir Motivação (CD 20) para descobrir que seu adversário está para pegar aquele buraco portátil para realizar algum propósito secreto.
  • xii. Finalmente, Carisma reflete como uma pessoa vê a si mesmo (ao contrário da consciência de si mesmo representada por Sabedoria), sua presença de espírito e autoconfiança. Para PdMs isso dita a habilidade/aptidão e condição para liderar outros ao seu redor. Um mestre vilão carismático deveria ser capaz de fazer um teste de Carisma (CD variando) para comandar seus vários seguidores e capangas a realizar coisas que eles normalmente não estariam dispostos a cumprir, e deveria usar livremente de Obter Informação e Diplomacia para aprender o que quisesse a respeito dos personagens dos jogadores.

Vamos admitir, um lich de 400 anos de idade, Inteligência 29, Sabedoria 14 e Carisma 17 deveria ter uma boa chance de ter previsto e preparado os devidos contra-ataques contra praticamente qualquer coisa que os jogadores possam usar contra ele. Então, quando os jogadores pagarem você mestre desprevenido usando um buraco portátil para jogar o lich dentro com um empurrão, dê ao lich um teste de Obter Informação (digamos, CD 10 talvez, dependendo da chance de algum espião do lich ter visto o item em uso antes) para saber se os personagens têm o item; então dê a ele um teste de Inteligência (CD 15) para permitir que ele tenha já lançado sobre si uma magia de Levitação, mesmo que você não tivesse anotado ela com uma das magias preparadas por ele no início do encontro. Afinal de contas, você não teve 400 anos para se preparar para qualquer eventualidade e você provavelmente não tem uma Inteligência 29 que lhe permitira ver essa linha de eventos também.

E não se esqueça do teste de Intimidar que permite ao lich congelar o personagem do jogador onde ele está quanto este tentar alcançar o item mágico, e do sorriso diabolicamente desencorajador do lich ao dizer: “Ah, a propósito, você achou a surpresa que eu deixei ali para o seu pequeno buraco portátil? Eu acho que você vai achar um estouro na próxima vez que usá-lo…”

Por Scott Holden-Jones
Tradução: Tzimisce

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