Arquivo REDERPG: O que é a Licenca D20? – História do RPG, parte II

Em 6 de março de 2004, foi publicado no antigo portal o  segundo de dois artigos escritos por Fabiano Silva sobre a então história recente do RPG, da década de 1990 em diante. O segundo artigo foi “O que é a Licença d20?” (1.382 leituras) e vocês podem conferi-lo a seguir.


O que a Licenca D20 – História do RPG – parte II

A História explica alguns dos motivos da criação e do seu impacto no mercado, mas não explica o que é essa coisa chamada D20. Existe muita discussão, muita contestação, mas pouca informação. Primeiro é importante esclarecer alguns conceitos que estão confusos ou mal explicados para os jogadores e escritores.

 

Licença Aberta

O termo licença aberta está sendo usado para classificar todas os sistemas que de alguma maneira possibilitam que sejam criados livros usando suas regras, isto é, todo sistema que você pode adaptar acaba sendo chamado de licença aberta. Isso cria uma falsa imagem: todos essas licenças são iguais ou similares, o que está muito longe de ser verdade. Toda licença aberta é diferente da outra, muito diferente. Não existe uma licença aberta default, um padrão, cada uma tem suas particularidades. Elas não podem ser comparadas apenas como: uma licença é americana e outra nacional, ou uma é popular, a outra alternativa. Cada licença precisa ser analisada separadamente. A própria Wizards tem mais de uma licença aberta, que não podem ser colocadas na mesma categoria.

D20 e OGL
Outra grande confusão é sobre as licenças da Wizards. Na verdade existem duas licenças diferentes da Wizards. Duas licenças bem diferentes: A D20 e a OGL (Open Game License). A licença D20 é a licença usada por todos os livros que tem o símbolo D20 na capa e a OGL só possui o termo de aceite, mas não tem o logo na capa. Mas qual a diferença entre elas?

D20 – A licença D20 foi feita para que todos os livros lançados usando a licença sejam compatíveis, isto é, um livro lançado na Austrália poderá ser usado como suplemento em sua campanha de Greyhawk ou Tormenta D20. Os escritores que desejam usar a licença podem criar ou modificar as regras D20 à vontade, mas tem que ficar atentos a três restrições: criação de personagens, evolução dos pontos de experiência e Open Game Content; e é aqui que tudo se complica e a desinformação faz com que opiniões equivocadas acabem confundindo mais ainda os escritores.

O que a Wizards quer dizer em não colocar o sistema de criação de personagens? Isso quer dizer que não posso criar uma classe nova? Não, não é isso. Na verdade você pode fazer um livro D20 sem classes. A licença D20 foi feita para que os jogadores usassem os três Core Books (Livro do Jogador, Livro do Mestre e Manual dos Monstros) como base e ai entra o sistema de criação. Os escritores não podem citar em seus livros nenhuma parte do sistema de criação de personagem, a mecânica da criação, isto é, como os personagens alocam seus atributos, como eles escolhem a classes. O que não pode constar no livro D20 é a mecânica da criação, mas a parte criativa fica livre: você pode criar um novo atributo usando as regras D20, você pode criar uma nova classe, etc… A restrição da evolução segue a mesma lógica: você não pode dizer como o mestre distribui pontos de experiência. A terceira restrição Open Game Content fica para um capitulo à parte.

Essas restrições servem para manter a compatibilidade dos livros D20, são elas que garantem que todos os livros D20 possam ser utilizados em todo mundo, em todo cenário. As restrições também ajudam a manter o lucro da Wizards, já que é necessário os Core Books para jogar.

Resumindo, o que precisa ficar de fora do livro D20 é à parte de mecânica que remete aos Core Books, mas toda a parte criativa fica livre para que os jogadores e mestre criem. Não gosta do sistema de magia? Crie um novo. Lembrando que esse seu novo sistema de magia, poderá ser usado não só em seus jogos, mas por todos os jogadores do Brasil de D20. Ou do mundo!

OGL – A segunda licença da Wizards é a OGL. Essa é a licença mais livre de todo mercado de RPG. Não existe nenhuma restrição, nem criativa ou comercial. Com a licença OGL você pode colocar tudo que quiser no livro, até mesmo a mecânica do jogo, e pode modificar tudo, pode refazer tudo… Com isso os jogadores não precisam comprar os Core Books: um OGL pode ter todas as informações necessárias para se jogar. A única desvantagem é que você não pode colocar o logo D20 na capa, pois os livros OGL podem não ser compatíveis com os livros D20. Podem… Nada impedi que você faca um livro OGL compatível com o D20.

Resumindo você pode escrever um livro OGL, sem consultar a Wizards, sem pagar a Wizards, sem comunicar ninguém. Escreva e venda. Bons exemplos de livros OGL são: Everquest, Conan RPG e Ação!!!.

SRD

Para facilitar a Wizards lançou os SRD (System Reference Documents – Documentos de Referencia de Sistema). Nem tudo nos Core Books faz parte da licença D20 (como os Deuses de Greyhawk que são de propriedade da Wizards). Os SRDs contem os termos e as descrições da licença, com isso todos os escritores de todo mundo podem usar a mesma base de dados e mesmos nomes, criando produtos compatíveis.

Open Game Content

O Open Game Content (Conteúdo de Jogo Aberto) é outra marca do sistema D20 que acaba esquecido, mas é um das melhores idéias dos últimos tempos. Todo livro D20 precisa que 5% do seu conteúdo seja Open Game Content e esses 5% precisam estar claramente descritos no livro. O que isso quer dizer? Que em todo livro D20 haverá 5% livre para todos os jogadores e escritores usarem. Tudo que for Open Game Content é livre de patente, pode ser usado livremente por todo mercado, até mesmo entre outras empresas, isso é, se você gostou de uma parte Open Game Content do Guia de Classes de Prestigio ou de Tormenta D20, você pode colocar nos seus livros, mesmo que o seu livro seja vendido, sem precisar pagar nada para as empresas.

Com o Open Game Content está se criando um verdadeiro aglomerado de informações livres, que podem ser usados por todos. E sempre que um novo livro surgir no mercado o conteúdo livre só aumentará. Isso não ajuda em nada a Wizards, nem as empresas, só os jogadores.

Vantagens

Com as explicações sobre D20 e OGL, chegou à hora de ver as vantagens de se criar um livro D20 ou OGL.

Mercado – A principal vantagem ainda é o mercado. Quando é lançado um livro D20 ou OGL já existe um grande mercado de jogadores, o maior mercado do Brasil e do mundo. Não existe a necessidade de criar um novo mercado para um novo sistema.

Compatibilidade D20 – O livro será compatível com todos os outros do mercado. O livro pode servir de suplemento para qualquer campanha, em todo mundo. Você não precisa criar o mercado.

Liberdade Criativa – A licença dá uma liberdade criativa maior que a maioria das licenças abertas. Por que? Porque você não precisa pedir autorização de ninguém para lançar o livro. Você não precisa do Ok da Wizards: escreva e lance. Muitas das outras licenças do mercado, por mais abertas que sejam, precisam da aprovação do dona do sistema, o que não acontece com o D20.

Liberdade Profissional – Não existe a desculpa que o jogador precisa gastar $200 para jogar um livro D20. Primeiro porque os jogadores D20 já terão esses livros e segundo você pode lançar um livro OGL com todas as regras necessárias. A escolha é sua como escritor, você não precisa pedir autorização para ninguém, não precisa nem perguntar para ninguém. Não conseguiu uma empresa para lança-lo? Você pode abrir a sua e lançar. Escreva e lance.

Suporte – A licença D20 possui o maior suporte para os seus escritores do mercado. Existe um grupo que cuida exclusivamente da licença, que responde prontamente as perguntas. Mas a grande vantagem não é esse e sim a comunidade D20. São dezenas de fóruns, listas onde você pode tirar suas dúvidas e conversar com editores que já lançaram livros D20, ou conversar com os próprios criadores do D20. Basta enviar uma mensagem. Até mesmo a dificuldade de língua não é uma desculpa para fugir do D20. Já existem fóruns onde se pode tirar duvidas da licença, autores nacionais que já lançaram livros D20 e até a própria Devir.

Prioridade – Usar um sistema já conhecido faz com que você, escritor, possa priorizar o que realmente importa. Você não precisa criar um novo sistema do zero, você pode adaptar o sistema e priorizar as partes que realmente fazem diferença no seu cenário. Se a magia é parte importante do seu mundo, priorize as magias.

Profissionalismo

Antes de terminar algumas palavras sobre o mercado… Existe uma grande diferença entre o jogador e o profissional do mercado. O jogador não tem responsabilidade com o mercado, não precisa conhecer o mercado e não precisa pensar no livro como um produto, mas apenas como um livro de jogo. Mas quando o jogador pensa em escrever o seu livro ele precisa mudar, tem que deixar de ser jogador e virar profissional. Isso não quer dizer que ele deve deixar de lado suas idéias, mas ele precisa começar a pensar no seu livro como um produto em um mercado. Ele precisa analisar todas as oportunidades do mercado, analisar qual as melhores oportunidades do mercado para o seu produto, sem preconceitos, sem restrições.

Seu livro será mais um entre vários outros do mercado, ele não vai se vender sozinho, cabe ao escritor e editor proporcionar as melhores condições para que seu projeto seja um sucesso. Analise todas as opções antes de tomar uma decisão e cuidado com a má informação e o marketing das empresas sobre seus sistemas. Não deixe de lançar um livro D20 só porque a Wizards é a líder do mercado, ou porque ele é popular ou não deixe de usar um sistema nacional só porque é brasileiro. Não lance um novo sistema, só porque é o seu sistema, ou porque você acha o seu sistema melhor que o D20, World of Darkness e GURPS juntos. Todo jogador acha isso… Mas até hoje eles continuam lá no topo das paradas e não é só pelo marketing…

Conclusão

Existem varias opções para se lançar um livro no mercado. Cada escritor deve analisar e pesquisar TODAS, sem preconceitos. Analisar as vantagens e desvantagens de cada uma. Analisar o que é melhor para o seu projeto. Não deixar de lançar um livro porque você não gosta do sistema, ou porque não gosta do autor do sistema. Se você quer entrar no mercado, quer ser um profissional, pense como um profissional, seja um profissional.

Open Game Content é uma idéia que só beneficia os jogadores, que tem um banco de dados de informações livres, material livre feito por empresas e por profissionais. Um conceito tão importante como a própria Licença Aberta.

O D20 e a OGL são uma ótima opção para se lançar um livro, um cenário: a primeira chance para que muitos jogadores possam finalmente realizar o sonho de lançar um livro. O D20 não está fazendo sucesso sem motivo no Brasil. Profissionais experientes do nosso mercado não estão apostando no D20 à toa: eles conhecem o mercado. Você não precisa da autorização de ninguém para isso: só precisa da sua imaginação. Então vamos parar de reclamar e vamos criar, escrever. Quantos mais livros no mercado, melhor para o RPG brasileiro. Seja D20 ou não.

Para ler a primeira parte desse artigo: https://www.rederpg.com.br/wp/2011/11/arquivo-rederpg-o-que-e-d20-e-ogl-historia-do-rpg-parte-i/

Por Fabiano Silva

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2 Comments
  1. Falando nisso a Rederpg não estava desenvolvendo um 3.75?

  2. Na verdade, a Iniciativa OGL 20 era uma iniciativa própria, apoiada pela REDE. Já faz um tempo que o Douglas D3 assumiu o comando, mas há não nenhuma informação mais atualizada sobre ela. O que posso te garantir é que o trabalho de tradução foi feito, faltava fazer a edição, que era algo bem trabalhoso. Mais informações nos links abaixo:

    https://www.rederpg.com.br/portal/modules/news/article.php?storyid=6383

    https://www.rederpg.com.br/portal/modules/news/article.php?storyid=6598

    Particularmente, eu ainda acho que há espaço no mercado brasileiro para um bom OGL da 3a Edição de D&D.

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