Part-Time Gods RPG (resenha)

“Eu sou um Deus, sua criatura imunda!”
Loki, Os Vingadores.

Se você sempre quis dizer essa frase, Part-Time Gods (em uma tradução livre “Deuses de Meio Período”) pode ser o jogo para você.

ANTECEDENTE

Part Time Gods (PTG) é um jogo da Third Eye Games, lançado em 2011, e em sua terceira edição. Pouco conhecido por aqui, ele já tem uma versão para o FATE também, embora o original utilize o DGS (Dynamic Gaming System) Lite, baseado em um único D20.

Um fato interessante sobre este jogo é que ele vem sendo bem elogiado a cada edição nova, e os suplementos também. Um bom sinal no nosso mercado tao dominado por editoras especificas, e que vem se abrindo mais e mais a financiamento coletivo e novos jogos.

CENÁRIO

PTG tem lugar no nosso mundo, e a abordagem é bem interessante, com uma pegada tragicômica no estilo que vemos em quadrinhos como Hellblazer e Sandman. Os deuses são apenas uma sombra do que já foram um dia, com poderes extremamente limitados, mas com grande potencial.

A historia, resumidamente, é de que a humanidade um dia foi visitada por uma força desconhecida, que o livro identifica como Source (Fonte). Uma mulher (adicione aqui o nome da primeira mulher mitológica da sua preferência, como Eva) foi até a caverna onde essa força estava e voltou mudada, carregada de poder, inteligência e paixão. Logo, os deuses começaram a povoar o mundo junto da humanidade, sem aparente lógica nas escolhas por parte da Fonte.

Conforme os panteões cresciam em número e poder, também o faziam em ambição. Zeus cobiçava o poder da Fonte, e convenceu outros lideres de panteões, encabeçando uma rebelião divina que aprisionou o poder original e deu a ele e seus aliados o controle sobre quem poderia ascender e de quem poderia remover o dom da divindade.

Tudo aparentemente foi bem, até que a entidade conhecida como Coiote descobriu que os deuses poderiam matar uns aos outros, e absorver seus poderes. Logo, isso escalou para uma guerra divina. A situação piora com entidades monstruosas cuja criação foi atribuída à Fonte aprisionada, que também possuíam o poder de matar deuses. Ao longo dos milênios, os deuses perceberam que seu poder diminuía, até que o momento mais critico chegou: Zeus foi assassinado… por mortais.

Saltamos para a época moderna, onde os deuses voltam a surgir indiscriminadamente… o que deveria ser impossível, já que nem mesmo os líderes dos panteões conseguiam mais criar novos deuses, tão enfraquecidos estavam. O tempo, parece, marca o retorno da Fonte, e de seus servos, os Outsiders (Forasteiros).

E é aí que seu personagem entra. Acolhido por uma Theology (os grupos de deuses do jogo, como uma casta, ou uma tribo), e membro de um novo panteão. Um novo deus, no momento onde poderes divinos se encontram mais enfraquecidos, e quando o inimigo está prestes a retornar. Além disso, você deve pesar o quanto está disposto a se entregar a essa missão. Quanto mais deus você se torna… menos humano fica. Qual lado você vai escolher? Deus em tempo integral… ou Deus de Meio Período?

O SISTEMA

O DGS Lyte tem sucesso em uma parte do que ele se propõe, que é ser um sistema simples. Tudo o que um jogador precisa é um D20, que será rolado contra uma dificuldade 10, 20, 30, 40, ou 50. Some os bônus, deduza penalidades, contabilize os resultados, e veja se teve sucesso ou não. Para a maioria das tarefas simples, que tem dificuldade 10, isso esta ok, ou para rolagens opostas, como em combate. Assim que a dificuldade, sobe, por outro lado, isso pode ser frustrante para personagens de pontuação inicial., já que muitas vezes eles terão cerca de 50% de chance de ter sucesso, ou menos, a partir de dificuldade 20. No caso de combate, como o dano é fixo a maior parte do tempo, com apenas os Boosts (acertos críticos) para aumentá-lo, os combates podem durar muito, devido aos personagens terem que minar a vitalidade uns dos outros.

O jogo oferece um sistema de atributos clássicos com distribuição de pontos simples, embora o processo de criar um personagem possa ser um pouco demorado, devido aos diversos fatores a se considerar.

Um diferencial aqui, é o lado divino. Os personagens possuem dois fatores que interferem um no outro, que são Spark (Centelha, ou Fagulha), e Bond (Ligação, Conexão), sendo que a Spark, que representa o poder divino, limita suas Bonds, que representam seu lado mortal. Basicamente, o personagem começa com 6 pontos de Bonds, e um ponto de Spark. No entanto, a soma dos dois nunca pode passar de 10 (o que limitaria o Spark a 4). Assim, se um jogador com seis Bonds e 4 Spark aumentar seu Spark em um nível, ele perde um ponto de Bond, adquirindo um Failure (Falha), que representa como ele sacrificou algo de sua vida mortal em detrimento de poder divino.

BRINCANDO DE DEUS

Uma vez que um personagem adquire a Spark (que pode ser matando uma divindade, recebendo o poder de alguém que se sacrifica por ele, ou simplesmente por acaso, estando no lugar certo na hora certa), ele passa a ter uma série de habilidades ligadas a um Domain (Domínio) que é basicamente sua área de atuação como divindade. PTG divide os Domains em Bestial (Bestiais, deuses que atuam sobre animais), Conceptual (Conceituais, que representam ideias comuns que podem ser interpretadas de formas diferentes, como Beleza, Justica, etc), Elemental (Elementais, que lidam com forças naturais), Emotional (Emocionais, lidam com sentimentos, instintos e claro, emoções), Patrons (Patronos, lidam com grupos étnicos, tribos e culturas como Viajantes, Punks, Gamers, Afrodescendentes, etc), Tangible (Tangível, que é uma “coisa” com a qual se pode interagir sensorialmente, como Sujeira, Música, Computadores, Miragens, etc), Crossovers (Cruzamentos, que lidam com Domains que passam entre os outros, como Sonhos, que podem ser Tangíveis ou Conceituais).

Agora que um deus possui seu Domain, ele passa a afetar o mundo com certos poderes inatos, que incluem a capacidade de sentir a Spark de outros seres divinos, um Territory (Território) onde seu Domain interfere com o poder de outros seres, como uma especie de terreno favorável a divindade e seus aliados, e Prayers (Orações), que reabastecem o poder divino mais depressa. Ele também se torna imortal enquanto possuir Spark permanente (perdendo um ponto a cada vez que morre para ressuscitar), e envelhece mais devagar.

Os poderes ativos aparecem na forma de Entitlements (Heranças, ou Direitos) que são pequenos poderes secundários que uma divindade pode utilizar para mudar de forma, ficar mais forte ou mais resistente, etc, e Manifestations (Manifestações), que são a parte onde o personagem realmente pode tentar alterar a realidade dentro de um campo especifico. Cada Manifestation tem três subdivisões, e o personagem que a compra é automaticamente proficiente em todas. Um teste simples diz se o personagem é bem-sucedido em seu uso de poder, com bônus circunstanciais como o sacrifício de sangue, enquanto penalidades ocorrem se ele tenta fazer algo que não seja de acordo com seu Domain especifico. O problema aqui é que os Domains não são perfeitamente encaixados para todas as Manifestations, e as opções que os jogadores tem são pre definidas pelas Theologies, o que pode levar a um deus praticamente impotente.

OPINIÃO

Part Time Gods parece ser um jogo original, com bastante espaço para personalização, e com foco mais em interpretação que em regras. Mas ele peca pela falha do mago de D&D: os personagens têm um começo difícil, com possíveis frustrações em rolagens de dificuldade moderada para cima. O bom senso do Mestre é fundamental aqui, e o foco realmente não deve ser em rolagens. Tirando esse fator, a falta de espaço para personalização dos poderes dos personagens (que ate aqui são limitadas pelas Theologies) trava bastante o potencial criativo do jogo. Uma boa dose de pequenos ajustes resolve isso com facilidade, e acredito que o jogo possa ser uma experiência bastante produtiva.

Notas (de 1 a 6)

Layout/Arte: 5 (O jogo tem ilustrações muito bonitas, mantendo uma boa média, mas conta também com várias imagens um tanto amadoras. Nada demais ou de menos. A diagramação é clássica, em duas colunas com fonte legível, sendo fácil de identificar o que se procura).

Conteúdo: 4 (Por motivos expostos acima, o jogo não é tão funcional mecanicamente no início, embora o roleplay compense. A praticidade e simplicidade do sistema, por outro lado, é um plus. O cenário em si, por outro lado, é rico e bastante atraente, com exemplos e dicas muito boas).

Texto: 4 (Clareza e facilidade de associação são coisas comuns aqui. Mas existem alguns fatores no livro que precisariam de revisão, pois são mencionados e não explicados, o que deixa um leitor inicialmente um pouco perdido).

NOTA FINAL 4 (Bom jogo, ainda crescendo, com bastante potencial).

Por Rafael Ramos Blanco
Equipe REDE
RPG

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