D&D Beyond: Vale a pena?

Num mundo em que as microtransações imperam nos jogos (principalmente eletrônicos), é absolutamente compreensível que o jogador de RPG fique um pouco indignado em ter que “pagar duas vezes” pelo mesmo material.

Você já tem o Livro do Jogador da Quinta Edição e aí você se depara com um site chamado DnD Beyond lhe cobrando o mesmo que você pagou no livro pra ter acesso aos mesmos conteúdos, só que numa plataforma online. Fica com cara daqueles esquemas para fazer dinheiro, tipo quando um estúdio faz uma sequência de filmes desnecessários ou piores só para engordar a carteira. Essa Wizards acha que engana quem? Esse site bonitinho aí não me compra não, vou guardar meu dinheiro.

Mas… será que é isso mesmo?

O Modelo de Negócio

A primeira verdade a ser dita é que o DnD Beyond NÃO é uma plataforma da Wizards. Sim, o site tem as mesmas fontes e layout dos livros, tudo parece bem ligado a marca e tal, mas não, o DnD Beyond é uma plataforma de uma empresa chamada Curse, que é especializada justamente em criar ambientes online para jogos.

Basicamente, o que a Wizards faz é produzir os livros e vendê-los a revendedores que vendem para você, fazendo com que todos lucrem no processo. Com o DnD Beyond não é diferente.

Pense no site como um desses revendedores, a galera do site compra a licença da Wizards (que produz o livro) e depois revende a você.

Algo semelhante é feito com o Roll20 e o Fantasy Grounds, essas plataformas compram a licença dos produtos da Wizards e depois vendem uma licença para seus clientes. É basicamente o mesmo que o Kindle ou iTunes fazem.

O ponto central aqui é, se você curte ir na lojinha de Magic comprar seus livros, seja para manter o negócio que você tanto estima, seja para alimentar a cena local, ou apenas porque você simplesmente está afim; o mesmo vale para o DnD Beyond. Se você quer ter o serviço online, a Curse precisa de dinheiro exatamente tanto quanto o amigo da loja de Magic. Então não é que a Wizards está inventando papagaiadas para arrecadar nosso dinheiro, é tipo uma outra loja querendo vender seu peixe, e não há nada de errado nisso.

Decidir se vale mais a pena ter o livro online ou o físico é uma matéria subjetiva. É provável que a maioria das pessoas prefira ter o físico, mas “a beleza está no olho de quem vê” (ou no olho do Beholder…). Pode ser que a proposta do Beyond lhe apeteça mais, ou que você simplesmente tenha condição de ter ambos. O importante é sacar que o site não é uma ladinagem da Wizards lhe forçando pagar duas vezes pela mesma coisa, mas apenas o serviço de uma empresa que revende D&D.

D&D Beyond é oficial?

Sim e não. Eles têm a licença oficial do D&D, eles podem vender o conteúdo com copyright dos livros e tudo mais. Mas o Beyond não detém o poder de oficializar materiais. Por exemplo, o Bloodhunter que lá está exposto entre as classes principais não é uma classe oficial. Isso não quer dizer que o Bloodhunter seja ruim ou mal feito, o Beyond o colocou lá porque sacou muito bem como a questão das streams alavancou a popularidade do jogo, e isso é muito positivo, pois aproxima o público do jogo, trazendo à tona aquilo que o público clama.

Mas quanto à oficialidade, classes como o Bloodhunter ou qualquer outra coisa que não venha de um material publicado diretamente pela Wizards, não são formalmente oficiais.

E por que simplesmente não vendem um PDF?

Num papo com uma colega que atua no Marketing de uma grande rede de varejo multinacional, ela explicou que a estratégia é não criar um produto substituto que lhe tire margem. Ao vender diretamente um PDF, o leitor pode não concordar em pagar o valor integral de um livro físico. Além disso, o PDF concorreria diretamente com o próprio livro. Mas e o Beyond também não concorre com os livros?

Mais uma vez, sim e não.

O fato de ter o livro digitalmente de fato equivale a ter um PDF, porém o Beyond traz outros atrativos, funcionando como um serviço, em que cada termo chave é clicável e salta a uma nova janela que mostra o significado daquele termo, levando a uma leitura mais objetiva que a convencional via papel. Isso sem citar os serviços de criação de personagem e organização de campanha. Sim, você pode achar alternativas para tudo isso na internet, por meios legais e ilegais, mas nenhum meio legal terá isso reunido numa única plataforma, com as artes e layouts oficiais, sem cobrar nada.

Vender apenas o PDF não seria atrativo nem para o vendedor e, de certa forma, nem para o consumidor.

Segundo os próprios desenvolvedores do D&D Beyond seria possível vender um livro físico que lhe desse uma chave de acesso aos digitais, mas não seria possível retroagir e conceder essa chave a quem já tem o livro físico. A Curse não pode doar seu serviço assim, afinal não existe almoço grátis. O próprio desenvolvedor cita que apesar de factível, a ideia do pacote físico + digital não sairá na prática: tanto a Wizards quanto a Curse precisam fazer dinheiro e é provável que o pacote custasse exatamente o valor da compra dos dois itens separados (podendo sair ainda mais caro, dado que o serviço de alocar a chave no livro físico possui um custo).

O que vem por aí

A pirataria é um problema quase insolúvel e há tempos que as próprias editoras já contam com ela no seu plano de vendas. A própria ideia de oferecer uma plataforma interativa em vez de um PDF é uma tentativa de aplacar essa sangria, você pode hospedar mil PDFs no seu site, mas muito dificilmente você terá um sistema interativo.

O Drivethru RPG, fundado por um ex-White Wolf, é uma plataforma de venda de PDFs. Ele concentra o maior acervo rpgístico à venda na rede e é a melhor alternativa a livros antigos com demanda menos aquecida que a Quinta Edição. Nessa onda, a White Wolf lança agora uma espécie de Netflix de livros: você assina um pacote e tem disponível o acesso aos mais variados livros da editora. Essa é uma abordagem muito interessante: muitas vezes você só quer ler 2 páginas daquele suplemento de Werewolf de 20 anos atrás e não vê valor em investir o valor integral num livro só por 10 parágrafos, então o que você faz? Você acaba baixando o livro (não que seja certo, mas é uma realidade).

Ao investir uma mensalidade com acesso a todo um acervo esse problema acaba: você pode buscar qualquer nota de rodapé em quantos livros quiser. Caso a White Wolf conseguisse vender seus livros antigos isoladamente, é provável que ela arrecadasse mais, mas tendo em vista que ela não vai vender tais livros tão facilmente, ela os dispõe num serviço de assinatura que garante um fluxo de caixa bem mais estável inclusive. Todo mundo sai ganhando.

Falando do Beyond, a plataforma permite compras isoladas de seções. Por exemplo, quer só as magias do Xanathar’s Guide? Não precisa comprar o livro inteiro, a seção de magias é vendida à parte. Essa é uma estratégia inteligente, pois atrai o consumidor que “precisa só de duas páginas”.

Ainda não há previsão para um serviço de assinatura como o da WW para D&D, mas não duvido que algo similar surja para as edições antigas num futuro não tão distante.

Falando em futuro, imagine um Beyond em português… Um aspecto interessante seria que correções e ligações entre os termos chaves poderiam ser constantemente revisados até se alcançar uma tradução primorosa, coisa inviável com livros físicos (não é adequado lançar uma errata por semana). Inclusive poderia servir muito bem como base para o texto do livro físico. Um devaneio utópico, mas não custa imaginar.

A tecnologia tem trazido novas abordagens e meios de jogar, cada vez mais o produto e o consumidor se aproximam, fichas automáticas, bibliotecas e todo tipo de serviço têm aparecido para facilitar a nossa vida. O livro físico não parece estar ameaçado, mas sim complementado. E você, o que acha desses recursos? Mutreta pra fazer dinheiro ou real facilitador?

Por Eduardo Vieira
Equipe REDE
RPG

dndbeyond.com

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