Vampiro 5ª Edição: Alessa Torres abre o jogo sobre sua saída do World of Darkness!

Salve Cainitas! Com esse bordão que muitos já ouviram, escrevo essa mensagem direcionada aos fãs de World of Darkness no Brasil.

Para quem não me conhece, me chamo Alessa Torres, outrora conhecida como Alessa Malkavian. Sou Especialista em Comunicação e Marketing, e atualmente sou bolsista no programa de Gerenciamento de Carreira – Soft Skills na Harvard Business Publishing. Profissionalmente, sou Revisora profissional, já tendo 5 participações publicadas na área de RPG, Consultora Cultural e fui Embaixadora das Comunidades Latino-americanas para a marca World of Darkness da Paradox Interactive por quase 4 anos.

Há meses venho pensando nessa mensagem, sinto que tardou mais que o necessário para escrevê-la. Precisei de um tempo para processar tudo que estava acontecendo e entender o panorama que me foi apresentado. Quando você se dedica integralmente a uma causa, a um propósito, a um projeto e sabe que você está cumprindo até mais do que se propôs a fazer, por quase quatro anos…uma demissão sem aviso prévio pode ser dramaticamente impactante. Portanto, nesse primeiro momento, me resguardei a proteger minha saúde mental e me dedicar integralmente à minha família, já que naquele ponto, não houve qualquer tipo de suporte à minha saúde por parte da Paradox Interactive. E sabemos que para muitas empresas que empregam pessoas de todas as partes do mundo, esse já é um tema amplamente discutido e levado em consideração.

O questionamento que vocês, leitoras e leitores fazem, é o mesmo que fiz durante algumas semanas. A seguir, eu não tratarei de conjecturas e suposições. E sim fatos, fatos esses que são passíveis ou não de suas conclusões.

Em 2018, iniciei em um cargo antigamente chamado de Community Manager. Uma rápida pesquisa no Google é capaz de mostrar a vocês, resumos do que uma pessoa nesse cargo faz. Basicamente são atribuições fortemente ligadas à área de Marketing e Comunicação de uma empresa, podendo ou não ser voltada às mídias sociais. Em teoria, é um cargo mais analítico que operacional. Em outras palavras, é mais backstages e menos dancinha no TikTok. A princípio, eu atuava nesse cargo apenas para a comunidade brasileira, mas no fim de 2018 as minhas ações e habilidades se expandiram para centenas de comunidades em toda a América Latina, o que me rendeu o título de Community Manager – LATAM.

Era apenas um título. Com mais atribuições, mais responsabilidade, mais “haters”, mais glórias. Mas tudo ainda dentro de um título. Não foi difícil operar dessa forma até 2020. Quando da noite para o dia, deixei de ser Community Manager para me tornar Community Ambassador, e por mais que os nomes sejam parecidos, são tarefas completamente diferentes. Posso citar exemplos de embaixadores famosos: Juliette, Anitta, BTS. E garanto a vocês, nada do que eu fazia se assemelhava às tarefas de qualquer uma dessas pessoas supracitadas. Na ocasião, minha nova desenvolvedora de comunidade, que em tese, era responsável por me orientar nessa parte, não me disse nada, até hoje.

A partir de meados de 2020, comecei a trabalhar praticamente sozinha. Embora eu tivesse muita autonomia e um gestor que acreditava no meu trabalho, eu tinha um entrave invisível. O que quero dizer é: alguém que não me permitia agir e o excesso de burocracia organizacional não contribuiu nesse processo.

Final de 2020: O trabalho dos sonhos se converte em pesadelo. Um pesadelo solitário. Um peso que não poderia ser dividido a nenhum outro ombro. Todos os dias a partir daquele momento, eu precisava me reinventar, na tentativa de ser menos excluída, já que as ações da nova desenvolvedora de comunidades tinha como principal objetivo excluir a comunidade latino-americana. Eu aceitaria qualquer coisa direcionada à minha pessoa naquele momento, até uma demissão não seria surpresa, contanto que o público não fosse afetado por essas ações. Meu maior questionamento era: como vou mostrar às pessoas um sonho que elas não podem fazer parte, e eu nem sequer sei a razão para isso? O que eles fizeram de errado?

2021 e 2022 serviram para calibrar ainda mais o sentimento de insignificância que nós latinos sofremos com algumas pessoas lá dentro. Nosso fôlego no meio do caos, foram as licenciadas brasileira e espanhola com seus lançamentos. Eu digo nosso, quando me refiro à pessoa latina. O público latino estava ocupado demais consumindo das licenciadas, questionando e cobrando as licenciadas. O que fez com que fôssemos – esquecidos – no bom sentido. Notem que tal qual na dinâmica de um valentão de escola, quando você é ignorado, é melhor. Ou menos pior.

Nem a menor ação da marca contemplava o público latino, havendo episódios de situações realmente embaraçosas envolvendo recursos oficiais – não monetizados – traduzidos. Porque eu jamais achei justo um continente inteiro ter de recorrer ao Google Tradutor para acessar um site, e pior…que desenvolvedores de uma marca global se sentissem feridos por isso.

Como eu disse no início do texto, vocês estão livres para tirarem suas conclusões, esses são os fatos.

Quando você acha que já viu demais, passa mais um ano e um material com insultos racistas, xenófobos e com altíssimo teor de intolerância religiosa sobre seu país é oficialmente lançado. Pleno ano 2022. Em Game of Thrones, Ned Stark sabia exatamente a partir de qual momento sua cabeça cairia. Naquele momento, eu sabia qual seria o meu. Eu me conhecia o suficiente para isso.

Eu me surpreendi positivamente com a postura da comunidade brasileira, e longe dos holofotes e das divergências que alguns criadores de conteúdo desejavam impetrar, cada uma das observações que cada fã apontou, eu traduzi devidamente e apresentei em reunião.

Foram mais de 100 comentários. Além deles, eu traduzi informativos jornalísticos e fragmentos de artigos científicos, lições de referências socioculturais como o Doutor em Linguística e autor do livro Racismo Linguístico, Gabriel Nascimento, e o professor Aciomar Fernandes do curso de Letras da UEMG, e além disso, eu sou brasileira.

Nada disso foi suficiente. Ou visto com bons olhos. Não pela massiva maioria que ali estava. E tampouco foi rápido para conseguir uma solução: que seria no mínimo reescrever e pedir desculpas de maneira decente. Foi pior do que se eu apenas tivesse que provar todos os pontos que eu estava apresentando, através das colocações da própria comunidade, ou as falas de professores e doutores brasileiros. Eu ainda tinha o desafio de mostrar à desenvolvedora de comunidades da marca que isso não era um desrespeito à pessoa dela. E os fragmentos racistas, xenófobos e de intolerância religiosa apresentados sobre meu país e meu povo, não estavam suscetíveis ao que uma pessoa branca europeia opinava. Me recusei a continuar ouvindo o que ela julgava ser justificativa ou mesmo sua tentativa em trazer outro consultor internacional para mostrar seus pontos para mim. Nos meus 28 anos de vida, não creio haver qualquer possibilidade de ponto de vista no que tange racismo, xenofobia e intolerância religiosa.

Confesso a vocês que eu não pensei que minha estadia fosse além de março de 2022. Não depois dessa fatídica reunião.

Mas o contexto das Trevas é cheio de plot twists e reviravoltas. Mas uma certeza você tem: não há vitória. Os fins são sempre amargos. Você nunca vence. Em 29 de março fui requisitada a escrever uma nota oficial para a comunidade brasileira, mas o que parecia uma grande conquista e um passo muito positivo, rapidamente se mostrou nebuloso. Ainda que meu gestor sempre fosse verdadeiramente feliz e grato pela possibilidade de conhecer outras culturas, pensamentos e pessoas, infelizmente essa ideia desagradava mais gente do que eu imaginava.

Primeiramente, fui proibida de escrever a nota em inglês. E publicá-la no site oficial da marca estava fora de cogitação. Eu só tinha os espaços das comunidades de fãs e as redes sociais WoD Latino-america. Isso obviamente desagradou muitos fãs, e também não era justo. Mas a gente já deixou de ver justiça nesse contexto há muito tempo, afinal. E aquilo que pensei que seria valorizado e bem aproveitado, o fato de poder sinalizar a marca sobre determinadas coisas e estar ali para isso, infelizmente foi deturpado a:

“Sua comunidade não tem poderes aqui.”

E é claro que não tem, pois se tivesse, não passaria por isso. Eu tive que sorrir, acenar e publicar a nota.

E para reforçar essa frase de que não temos poder lá, a contar deste dia, foram exatos três meses para eu ir embora. Nesses três meses não havia mais pauta para mim, nada que viesse da marca oficial que contemplasse a comunidade latinoamericana, nenhuma mídia, nenhum reconhecimento, nenhum trabalho de fã latino divulgado no programa semanal, absolutamente nada.

Só poderíamos novamente contar com as licenciadas oficiais e os próprios fãs. E vocês podem perceber isso nas redes sociais WoD Latinoamerica, pois as últimas ações foram em parceria com licenciada e com a ajuda de outros fãs.

Minha estadia acabou acompanhada de uma série de conclusões sobre os últimos tempos difíceis. A sensação era triste, mas de dever cumprido. Na mesma intensidade que eu tinha certeza da série de ataques velados à minha comunidade, eu tinha a certeza de ter feito tudo além do que eu realmente poderia. E, acreditem ou não, tentar encontrar a maneira mais correta de agir quando tudo está absolutamente errado, é uma tarefa muito complicada.

Não sei como serão os próximos meses, como a comunidade latino-americana será representada ou se será. Neste momento, acredito que não, pois a minha posição já estava à disposição da pessoa desenvolvedora de comunidades com o único objetivo de operar diretamente no Discord e atender exclusivamente às comunidades estadounidenses e europeias.

Minha intenção não é fazer com que vocês sintam qualquer forma de empatia ou compaixão por mim – que são bem vindas, obviamente – e sim que vocês tenham pensamento crítico sobre todos os fatos apresentados até aqui. Continuar a consumir também envolve liberdades individuais. O que vocês fazem com essas informações, é total critério de vocês. Saliento que me responsabilizo pelo que eu disse aqui, não tendo citado o nome de qualquer pessoa envolvida.

Para mim, o que está em jogo é unicamente o meu senso de justiça, já que nada voltará a ser como era, principalmente nos anos de 2018-2019, os mais gloriosos da minha realidade nesse contexto.

Não concordo e não endosso ataques em redes sociais ou situações semelhantes, pois como eu disse acima, as coisas não voltarão a ser como eram. Depois de quase 4 anos, levando World of Darkness para Cuba, Venezuela, milhares de comunidades em toda a América Latina, programas de televisão aberta no Brasil e fora dele, o feedback da reunião demissional foi:

“Vamos focar no mercado estadunidense e europeu, portanto vamos contratar alguém desse país. O mercado latino-americano não dá lucro.”

A mensagem foi muito clara, cristalina como água. Talvez seja um enorme equívoco por parte de grandes marcas mundiais que investem no mercado latino-americano ou da minha parte, por uma das últimas coisas que eu disse:

“Então essa é a mensagem que uma marca que se diz global quer passar, a de que eles não importam?”

A diferença é que agora a comunidade já sabe…

Por Alessa Torres
24/10/2022

 

 

 

Share This Post

Leave a Reply